sábado, 10 de fevereiro de 2018

Carnaval e Futebol

 
Numa sociedade em que as emoções são cada vez mais controladas em nome da civilização e dos deveres de convivência, Carnaval e Copa são fantásticos momentos de excitação, transgressão e de certo descontrole de algumas manifestações reprimidas. 
 
São instantes com todos os ingredientes de que se compõe o melhor da vida: a competição, a sorte e o azar, o talento, a superação, o riso, o choro, o risco e o suposto elemento neutro: o árbitro — que nos permite justificar qualquer revés.
 
Aquele senhor de preto correndo pelo campo e os juízes invisíveis das notas na quarta-feira nos permitem considerar que nem toda a derrota é total. Nada mais humano que justificar os 7 x1 que temos de enfrentar nas derrapagens da vida.
 
A explosão de alegria do Carnaval — com o inacreditável pit stop das mazelas rotineiras — causa espanto e admiração.   Já a paixão pelo futebol, normal aqui e em todos os países do mundo, é um fenômeno que devia ser melhor apurado  por estudiosos.
 
No Brasil, o futebol é tudo e o resto é quase nada. Não é por acaso que a elite dirigente tenta usar o esporte como instrumento legitimador. Tem muita coisa em jogo aí. É  por meio desse esporte que indivíduos excluídos chegam à condição de heróis. 
 
É por meio das competições entre clubes e países que os pobres conseguem ter a sensação de “pertencer” a uma torcida, a um time e, principalmente,  ao Brasil. É um dos únicos momentos em que os pobres “pertencem”, fazem parte de algo.
 
Os jogadores são elevados à condição de heróis por várias razões. Uma delas: são a afirmação de um sentimento raro: o orgulho de ser brasileiro. Outra: dão a entender que existe mobilidade e que somos um país de avanços sociais, o que nem é verdade.
 
Para alguns críticos, o futebol induz ao conformismo. E daí, pergunto eu. Em um país marcado pela desigualdade só o futebol ainda pode nos fazer acreditar, pelo menos em raros momentos, que somos todos iguais, todos brasileiros e que estamos todos juntos.
 
O futebol cumpre funções muito além do que seria racional porque o Estado é incapaz de promover políticas públicas de educação. Sem escola, o brasileiro destaca-se pelo futebol (Pelé etc) pela música (Tom Jobim etc) e pela beleza (Gisele etc).
 
Como dizia Darcy Ribeiro, os dons do brasileiro não chegam pela escola, mas pela natureza, pela genética ou pelas mãos de Deus. Em 2018 temos uma Copa e, mais uma vez, devemos nos consagrar na Rússia pelo nosso maior esporte. 
 
A autoestima do país dependerá do resultado da competição. É sofrido saber disso – afinal o jogo é dominado pela arbitrariedade: a sorte e o azar, ou o mau momento de um jogador. Não há nada a fazer. Paciência...vamos todos compartilhar uma festa fantástica.
 
É Carnaval, não leve a mal, mas não posso encerrar sem dizer uma coisa: levando em conta a descrença geral, só fico preocupada com uma coisa: o que é que vai acontecer num eventual cenário de derrota? Bate na madeira, mangalô três vezes.

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