sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Poema pouco original do medo

O medo vai ter tudo
pernas
ambulâncias
e o luxo blindado
de alguns automóveis
Vai ter olhos onde ninguém o veja
mãozinhas cautelosas
enredos quase inocentes
ouvidos não só nas paredes
mas também no chão
no teto
no murmúrio dos esgotos
e talvez até (cautela!)
ouvidos nos teus ouvidos
O medo vai ter tudo

fantasmas na ópera
sessões contínuas de espiritismo
milagres
cortejos
frases corajosas
meninas exemplares
seguras casas de penhor
maliciosas casas de passe
conferências várias
congressos muitos
óptimos empregos
poemas originais
e poemas como este
projetos altamente porcos
heróis
(o medo vai ter heróis!)
costureiras reais e irreais
operários
(assim assim)
escriturários
(muitos)
intelectuais
(o que se sabe)
a tua voz talvez
talvez a minha
com a certeza a deles
Vai ter capitais

países
suspeitas como toda a gente
muitíssimos amigos
beijos
namorados esverdeados
amantes silenciosos
ardentes
e angustiados
Ah o medo vai ter tudo

tudo
(Penso no que o medo vai ter
e tenho medo
que é justamente
o que o medo quer)
O medo vai ter tudo

quase tudo
e cada um por seu caminho
havemos todos de chegar
quase todos a ratos.

Alexandre O’Neill, No reino da Dinamarca, 1958.
 




terça-feira, 21 de agosto de 2018

O meu lado

Tenho evitado escrever sobre coisas que não me dizem respeito, mas sempre estarei ao lado daqueles que defendem o interesse público. O meu lado é, como deve ser, o lado da democracia.

domingo, 19 de agosto de 2018

O sol e a morte


Dizem que há duas coisas que o homem não consegue encarar de frente: o sol e a morte. Esta última é particularmente verdadeira para homens e mulheres do Ocidente.  Sobre o sol acredito que se trata de metáfora: não queremos ver nada sobre luz intensa. Não queremos enxergar aquilo que devíamos ver. Do contrário, teríamos obviamente de enxergar o outro. E seríamos mais responsáveis com a dor alheia. Ás vezes, acho que muitos fecham os olhos.  Para não ver a verdade:  e a verdade é que não sabemos o que fazer com as milhares de pessoas que sonham e que precisam de um Brasil melhor. É triste e desalentador ver nosso país, embora tão próspero, está aceitando só patrulhar a morte de muitos aqui nasceram.
 

quarta-feira, 8 de agosto de 2018

12 livros para o Dia dos Pais

 
1. Tempos vividos, sonhados e perdidos, Tostão - Qualquer fã de futebol vai curtir a leitura do livro de Tostão. Um dos maiores jogadores de todos os tempos, Tostão foi sempre um ponto fora da curva no esporte brasileiro. Leitor voraz, médico e professor, é um dos poucos atletas que se dedicaram a refletir sobre o futebol. Mais do que uma autobiografia, o livro é um passeio pelos temas e ideias que Tostão cultivou, e dá ao leitor um acesso único não apenas ao jogador, mas também ao espectador, ao torcedor e ao fã.
 
2. O melhor do humor brasileiro, de Flávio Moreira da Costa (Org.) - De relatos e poemas anônimos dos primórdios da nossa colonização aos grandes nomes do humor atual, O melhor do humor brasileiro é um passeio delicioso e instrutivo pelo olhar brasileiro mais sardônico. Muito deboche e inteligência ao longo de mais de 500 anos.
 
3. Z: a cidade perdida, de David Grann - Uma história real: em Z: a cidade perdida, o jornalista David Grann investiga "o maior mistério envolvendo as explorações do século XX". Assim como as gerações que o precederam, David Grann acabou atraído pelo "inferno verde" da floresta. Sua busca pela verdade e suas revelações sobre o destino de Z compõem o cerne dessa envolvente aventura. Z: a cidade perdida ganhou uma adaptação para os cinemas neste ano com direção de James Gray.
 
4. O poder do hábito, de Charles Duhigg - Neste livro, o autor mostra que a chave para o sucesso é entender como os hábitos funcionam - e como podemos transformá-los. Ele utiliza diversos casos para mostrar como pessoas e empresas conseguiram ter sucesso focando em padrões que moldam cada aspecto de nossas vidas e tiveram êxito transformando seus hábitos.
 
5. Correr, de Drauzio Varella - Corredor e maratonista há mais de vinte anos, Drauzio Varella escreve sobre o hábito que lhe dá paz de espírito para enfrentar os deveres da vida de médico, escritor e voluntário. Leitura indispensável para incentivar futuros corredores.
 
6. O fim do homem soviético, de Svetlana Aleksiévitch - Svetlana Aleksiévitch apresenta um olhar diferente de importantes eventos históricos, por isso o último livro lançado no Brasil da Nobel de Literatura é uma ótima leitura para quem gosta de história e grandes reportagens. O livro traz um painel fantástico de russos de todas as idades que se movem entre a possibilidade de uma vida diferente e a derrocada da sociedade que conhecem.
 
7. Ainda estou aqui, de Marcelo Rubens Paiva - Em 1971, o deputado Rubens Paiva, pai de Marcelo Rubens Paiva, foi preso por agentes da ditadura, torturado e morto. Eunice Paiva, casada com o deputado, teve que criar seus filhos sozinhos desde então, sempre à procura do marido desaparecido. Em meio à dor, ela se reinventou. Voltou a estudar, tornou-se advogada, defensora dos direitos indígenas. Nunca chorou na frente das câmeras
8. O livro das citações, de Eduardo Giannetti - Leitura inspiradora e cheia de ideias é O livro das citações, de Eduardo Giannetti. Fruto de um trabalho de pesquisa de mais de três décadas, este livro reúne frases de pensadores, filósofos e escritores, formando um vivo panorama intelectual dos últimos 2500 anos.
 
9. Da minha terra à Terra, de Sebastião Salgado - Seu pai gosta de fotografia? Da minha terra à Terra é uma leitura imprescindível sobre um dos maiores fotógrafos brasileiros: Sebastião Salgado. Neste livro, ele conta pela primeira vez a sua história e seus pensamentos, passando pelas raízes políticas, éticas e existenciais de seu engajamento fotográfico.
 
10. O homem que comeu de tudo, de Jeffrey Steingarten - Um livro diferente para pais que gostam de gastronomia. O homem que comeu de tudo é uma antologia dos artigos do temido e festejado crítico gastronômico da Vogue americana. Livro divertido e impiedosamente irônico.
 
11. Os cem melhores contos brasileiros do século, de Italo Moriconi (Org.) Para fãs da literatura breve, Italo Moriconi garimpou os cem melhores textos do gênero produzidos no Brasil ao longo do século XX- Uma antologia capaz de traduzir as mudanças do país e as inquietações de várias gerações de brasileiros, em cem anos de produção literária.
 
12. Sócrates, de Tom Cardoso - Biografia escrita por Tom Cardoso. Ídolo do Corinthians, capitão da mítica Seleção da Copa de 1982, Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira deixou sua marca também fora dos gramados. É a história e as histórias do jogador mais original do futebol brasileiro.

terça-feira, 7 de agosto de 2018

Todos os jornalistas são de esquerda, mesmo os que são de direita...

«Todos os jornalistas são de esquerda», diz um amigo. Em seguida, acrescenta: «mesmo os que são de direita». No Brasil não há pesquisa, mas a Suiça fez uma sondagem, há alguns anos. Lá, 75% dos jornalistas afirmaram  que são de esquerda. Na população, as percentagens inverteram-se: só uma parcela de 25% se disse de esquerda).
 
Definir a esquerda e a direita implica imensas perspectivas históricas, porque os conceitos quiseram dizer coisas diferentes em diferentes momentos. Na Espanha usam os termos esquerdas e direitas porque há gente à esquerda socialista, comunista (com 33 variações), ecologista, e mais outras famílias, e há gente à direita conservadora, liberal, nacionalista e até definições como «democracia cristã».
 
Há pontos em que as esquerdas e as direitas se unem, noutras há movimentos cruzados: um liberal estará de acordo com os socialistas (na versão «terceira via») nas questões morais, e os comunistas e nacionalistas estão de acordo em muitos assuntos.
 
Critérios tradicionais, como propriedade privada / estatização já estariam desatualizados, porque a esquerda socialista evoluiu nessa matéria, mas mantêm-se outros como liberdade / igualdade. O critério que parece mais decisivo - é o antropológico.
 
A direita acredita na existência de uma «natureza humana», e é extremamente pessimista sobre essa natureza. A esquerda ou não acredita na «natureza humana» (que diz ser uma construção histórica), ou considera que ela existe e é essencialmente positiva.
 
De um lado Maquiavel e Hobbes, do outro Rousseau e Marx. Dessa concepção decorrem quase todas as consequências: atitude face às instituições, face às utopias, face à noção de progresso, e outras. Mas o que mais conta para os estudiosos modernos são as soluções («as respostas»).
 
Em tempo: há governos democráticos de centro- direita e de centro - esquerda em vários países há décadas.