quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Humanismo

Na montanha VII
"Mas, que era afinal o Humanismo? Era o amor aos homens, nada mais, nada menos, e por isso mesmo era também uma política, uma atitude de revolta contra tudo quanto mancha e desonra a ideia de Homem. Tinham censurado ao pai de Settembrini o apreço exagerado da forma; mas ele cultivara a bela forma ùnicamente por amor à dignidade humana, em esplêndida oposição à Idade Média, que vivia não só encarregue à misantropia e à superstição, mas que também tinha sossobrado numa ignomiosa falta de forma. Acima de tudo defendera a Liberdade do Pensamento e o prazer de viver, sustentando que o Céu pertencia aos pardais. Ah, Prometeu! Fora, para ele, o primeiro humanista e idêntico àquele Satã, ao qual Carducci dedicara o seu hino… Oh, se os primos pudessem ouvir como o velho bolonhês maldizia e zombava da sensibilidade cristã do Romantismo! Dos hinos Sacros de Manzoni! Da poesia de sombras e luares do romanticismo, que ele comparava à «pálida monja celeste Luna!» Per Baccho, que prazer sublime, escutar esse homem! E também deveriam ter ouvido Carducci a interpretar Dante: celebrara-o como cidadão de uma metrópole, que defendia contra a ascese e a negação do mundo a força activa que revoluciona e melhora o mundo. Porque, não era a sombra enfermiça e mística de Beatriz que o poeta honrava sob o nome de «donna gentile e pietosa»; pelo contrário, designava assim a sua esposa que no poema representava o princípio do conhecimento das coisas deste Mundo e da actividade na Vida…
Desta maneira, Hans Castorp tinha aprendido muitas coisas sobre Dante, e da melhor das fontes. Não se fiava irrestritamente nestes seus novos conhecimentos, dada a leviandade de quem lhe servia de intermediário. Mesmo assim, valia a pena saber que Dante fora um cidadão activo e lúcido."

MANN, Thomas, "A Montanha Mágica".

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