sábado, 27 de dezembro de 2014

Educação em desuso

 
 
Fui educada em cânones seguramente em desuso. Aprendi, por exemplo, que ninguém tem o direito de dar zero a ninguém por duas razões: 1) não é correto e 2) não é uma atitude verdadeira.

Ninguém é apenas zero. Todo o mundo tem seu valor. Todo o mundo é referência para alguém: seus amigos, a família, os vizinhos. Todos tem qualidades e sentimentos. 

Estou falando a propósito da revista Veja ter divulgado ranking de políticos com os senadores Cristovam Buarque e Aécio Neves no final da lista. Discordo. Eles são quadros políticos acima da média. Não sou eu que estou dizendo: quem diz isso é a História. 

Em certa ocasião, assim que saí do jornalismo e passei a fazer assessoria de imprensa, pensei em fazer um ranking de avaliação dos políticos para o mercado, mas não conseguir avançar. O negócio de dar nota aos outros é difícil até para professores. 

Sob nenhum critério eu diria que alguém é zero. Uma avaliação específica não traduz a complexidade do trabalho feito por ninguém. Volto aqui à história da educação. Aprendi que respeito é a base da convivência. Hoje em dia, porém, sei que isso está fora da moda. Tanto que às vezes sinto-me como se fosse uma pessoa do passado mais remoto.

Quase ninguém segue ou parece conhecer as regras que me foram ensinadas desde criança como não fazer aos outros o que não desejo que me façam. Ou, que ninguém é zero. Pois é, posso estar inadequada, mas não consigo, e nem quero, abdicar das coisas que aprendi. 

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Poema de Natal

Natal
Menino, peço-te a graça
de não fazer mais poema
de Natal.
Uns dois ou três, inda passa...
Industrializar o tema, eis o mal.

Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Obama e a história






"Tudo o que você faz neste mundo ecoa pela eternidade", diz o protagonista do filme "Gladiador" logo no início da trama. Lembrei disso hoje ao ler que os Estados Unidos da América e Cuba estão prestes a reatar o diálogo e retomar relações diplomáticas. Segundo o jornal "The New York Times", cogita-se reabrir, pela primeira vez em mais de meio século, uma embaixada americana em Havana. A representação diplomática de Washington na ilha de Fidel Castro foi encerrada em 1961, ano em que os EUA iniciaram o embargo. Agora, Obama faz o gesto histórico que seguramente ecoará pela eternidade. Ainda é cedo para saber todos os impactos, mas acredito que a vida dos cubanos da ilha, as maiores vítimas das restrições sociais, políticas, econômicas e humanas do embargo, vai melhorar. Para o regime anacrônico de Cuba é que não vejo horizonte: o fim do embargo pode ser sua cerimônia de adeus. 

sábado, 6 de dezembro de 2014

Saúde Drica Moraes!




Soube que Drica Moraes afastou-se da novela “Império” por questões de saúde. Vou rezar e pedir a meus santos de devoção sua rápida recuperação. Conheci Drica Moraes em 2002, quando fazia assessoria de imprensa para espetáculos do CCBB em Brasília. Ela veio apresentar-se na cidade e coube-me a prazerosa tarefa de acompanhá-la nas entrevistas aos veículos de informação para atrair o público da cidade. 
 
Na véspera da estreia, quando voltávamos para o CCBB, depois de uma entrevista ao vivo no DF TV, 1ª edição, ela perguntou se eu não gostaria de morar em uma cidade que tivesse praia "por ser mais divertido". Respondi que quando chegasse a aposentadoria, eu iria morar em Vila Velha, no Espírito Santo. Ela perguntou se era legal, eu disse que não sabia. "Só sei que tem praia". Ela riu e ficou calada até o fim do trajeto. 
 
Na noite seguinte, o teatro lotou. Drica brilhou no palco, fazendo coisas do arco da velha. Lembro uma cena fantástica: ela simulando o desespero de uma patricinha para falar no celular mesmo com sinal ruim. Drica andava pelo palco inteiro agachando-se de um jeito sensacional, como se estivesse desesperada para buscar o sinal no espaço. 
 
O público caiu na risada. Ela lutava pelo sinal do celular e, ao mesmo tempo, mostrava o ridículo de fazer aquilo, de agir daquela maneira. Quase todo o mundo ali já tinha se abaixado daquela maneira, procurando uma posição melhor para manter a linha e seguir falando. A Drica repetindo alô, alô, com o corpo dobrado, quase caindo à beira do palco, era o retrato de todos nós. Diante de tamanho ridículo, só nos restava uma vingança: o riso frouxo e livre. 
 
Rimos muito naquela noite, e nas noites seguintes. Drica foi aplaudida inúmeras vezes em cena aberta. A casa  lotou durante toda a temporada, mesmo com dezenas de cadeiras extras. Sucesso. Numa das noites, ela incluiu um texto na cena do celular que era dirigido exclusivamente a mim. E só nós duas sabíamos disso. 
 
Ela disse mais ou menos o seguinte: “quando chegar a aposentadoria vou para Vila Velha no Espírito Santo. Se a linha do telefone lá é melhor? Deve ser igual, mas lá tem praia. Praia!!! Alô, Alô, Alô, vou ver a linha do horizonte na praia...Linha? Ca..iu, ca ca caiu! Por um momento, em meio a centenas de pessoas, me senti única. Foi como se ela estivesse falando comigo apenas, uma sensação boa e inesquecível.  Quando terminou o espetáculo, fui agradecer, mas ela fez de conta que não era nada. 
 
Voltamos a conversar no dia seguinte, véspera de sua partida. Ela havia terminado de fazer Bossa Nova, filme de Bruno Barreto. Drica perguntou se eu havia visto filme. Sim, eu disse. Ela ficou me olhando, sem dizer nada, mas seu rosto dizia tudo: esperava que eu falasse mais alguma coisa para conferir se eu havia visto o filme de verdade. Falei de Nadine, sua personagem, uma fanática por computadores. Seu rosto suavizou em sinal de aprovação e assentimento. Comentamos também sobre a brilhante trilha sonora do filme.
 
Não voltei a vê-la ao vivo, só no cinema e na televisão. No filme Bruna Surfistinha, ela fez uma cafetina inesquecível. Como a inesquecível Cora de Império, a inesquecível Nadine de Bossa Nova mas, sobretudo, como a inesquecível patricinha do celular que tive a alegria de ver no CCBB de Brasília há mais de uma década. E que jamais vai sair da minha memória. Saúde Drica Moraes! 

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Você conhece "o demônio de Evágrius"?





No livro "Origens Sagradas das Coisas Profundas”, Charles Panati conta que o teólogo e monge grego Evágrius Pôntico (346 d.C. a 440 d.C) identificou, depois de estudos no Egito, os oito males do corpo humano que deram origem aos sete pecados capitais. Gula, avareza, luxúria, ira, melancolia, acédia, vaidade e orgulho constam da lista original. Mais tarde, a Igreja usou a lista de de Evágrius. mas substituiu melancolia por preguiça e excluiu a acédia — ou acídia. 

Na história da filosofia, a definição de acédia é "estado de torpor, de ausência de atenção e de cuidado exterior, de alheamento em relação à pessoa em si mesma e em relação ao mundo que a rodeia". Na Idade Média, dizia-se que a acédia, também conhecida como o "demônio de Evagrius" — em razão do nome do teólogo que a definiu — adormecia os monges. Entorpecidos, eles conviviam, sem reagir ou protestar, com os atos mais cruéis e desumanos.  

Quando vejo algumas pessoas dizendo, em relação à corrupção e a degradação política, que “não há nada a fazer, pois todos são desonestos”, penso no demônio do Evágrius. Se parcela significativa da população achar que devemos dar de ombro e mudar de assunto vai aumentar a indiferença e vai crescer o alheamento, mas não é este o melhor caminho. Adormecer não funcionou para aliviar os crimes da Igreja no passado e não vai garantir a inocência dos corruptos hoje. 

A Justiça não socorre aqueles que dormem. Na verdade, só ganha a guerra contra a desonestidade e a corrução quem persiste, quem faz leis duras, quem pune corruptos com a cadeia. Sem fraquejar, sem ceder às tentações, sem adormecer um só dia, uma só noite.  Não existe "povo corrupto" em países que estão mergulhados na crise moral e povo honesto e imaculado em sociedades onde o flagelo da roubalheira está sob controle. 

O combate à corrupção deu certo onde as instituições funcionam, onde existe liberdade de imprensa e as leis valem para todos. Não é função do Estado a reforma dos costumes e valores. Isso é tarefa para os pais, os educadores, os pregadores. E eles fazem bem o seu trabalho. Ensinam valores, agem de forma correta. Sem perder a esperança. Estão certos. Os horizontes da honestidade são amplos. Não falo por ser otimista, mas por ser realista. 

Os corruptos perderam a guerra no lado do mundo onde se vive melhor. Estão perdendo aqui também. Corruptos identificados pela Justiça não podem andar nas ruas, ir a restaurantes ou embarcar em aviões. A corrupção não favorece os negócios. Encarece o preço dos bens e serviços. Desorganiza e inflaciona a economia. Prejudica a produtividade. Causa depressão, tensão e insatisfação. País corrupto perde oportunidades e investimentos.   

O povo não é trouxa. Tanto que ninguém acredita na balela de que podemos fazer as coisas de modo corrupto e criminoso porque outros agem de modo corrupto e criminoso. Não estamos numa competição para saber quem é pior. Alegar que está tudo bem porque temos companhia no banco dos réus é fazer discurso infantil e desqualificado, além de desrespeitoso com a inteligência e os valores dos outros. Sem contar que não inocenta ninguém. No máximo, mostra que o banco dos réus está lotado, tão cheio que tem gente saindo pelo ladrão.
 

domingo, 30 de novembro de 2014

Um bom conselho...





Evite trabalhar para quem nunca trabalhou.

sábado, 29 de novembro de 2014

Homens e Ratos




Precisamos controlar a soberba, o orgulho e a arrogância. Depois do sequenciamento do genoma humano e também do genoma do camundongo —  em 2002 — ficou provado que nós temos enorme semelhança. Chegaram a dizer que somos essencialmente camundongos sem caudas – mesmo tendo genes que poderiam fazer uma cauda. É isso: a comparação dos genomas do homem e do camundongo revelou uma perturbadora coincidência de 99% entre os genes das duas espécies.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Um dos livros mais importantes do mundo

COMO FOI ESCRITO
 

 
Durante o reinado de Zhao, o monge e teólogo Lao Tsu percebeu que a guerra terminaria por destruir o lugar onde vivia. Como havia passado anos meditando sobre a essência da vida, tinha pleno conhecimento de que é preciso ser prático  em certos momentos. Decidiu mudar-se. Pegou rapidamente os poucos pertences e preparava-se para sair, quando foi interpelado pelo guarda que protegia a região: 

— Onde está indo tão importante sábio? — perguntou o guarda.
— Para longe da guerra.
— O senhor não pode partir assim. Eu gostaria muito de saber o que foi que aprendeu em tantos anos de meditação. Só o deixarei partir se dividir comigo o que sabe.
 
Apenas para se livrar do guarda, Lao Tsu escreveu ali mesmo um pequeno livrinho, cuja única cópia lhe entregou. Depois, continuou a viagem e nunca mais se ouviu falar dele. O guarda saiu pregando o texto de Lao Tsu, que acabou sendo copiado e recopiado. Resultado: o livro atravessou séculos, atravessou milênios e chegou até o nosso tempo. O título é “Tao Te King” e está publicado em português. A seguir, alguns dos seus ensinamentos:

Aquele que conhece os outros é sábio Aquele que conhece a si mesmo é iluminado.

Aquele que vence os outros é forte Aquele que vence a si mesmo é poderoso

Aquele que conhece a alegria é rico.

Aquele que conserva seu caminho tem vontade.

Seja humilde, e permanecerás íntegro. Curva-te, e permanecerás ereto.

Esvazia-te, e permanecerás repleto. Gasta-te, e permanecerás novo.

O sábio não se exibe e, por isso, brilha. Ele não se faz notar e, por isso, é notado. Ele não se elogia e, por isso, tem mérito. E porque não está competindo, ninguém no mundo pode competir com ele.
Os poucos fatos históricos conhecidos sobre o livro
 Tratase de um texto filosófico relativamente curto, com pouco mais de 5 000 caracteres. Os mais recentes estudos apontam que o Tao Te Ching tenha sido escrito entre 460 a.C. e 380 a.C. A primeira tradução do Tao Te Ching para uma língua ocidental ocorreu somente no século XVIII, por obra de missionários jesuítas na China. Essa tradução foi apresentada na Real Sociedade de Londres para o Melhoramento do Conhecimento Natural em 1788. Desde então, o Tao Te Ching tornou-se cada vez mais conhecido no ocidente, sendo, atualmente, um dos livros mais traduzidos no mundo.
 
Traduzido como O Livro do Caminho e da Virtude, é uma das mais conhecidas e importantes obras da literatura da China. Foi escrito entre 350 e 250 a.C. Sua autoria é, tradicionalmente, atribuída a Lao Tzi (literalmente, "Velho Mestre"), porém a maioria dos estudiosos atuais acredita que Lao Tzi nunca existiu e que a obra é, na verdade, uma reunião de provérbios pertencentes a uma tradição oral coletiva versando sobre o tao (a "realidade última" do universo). A obra inspirou o surgimento de diversas religiões e filosofias, em especial o taoismo e o budismo chan (e sua versão japonesa, o zen).

 Lao Tzu encontra Yin Xi, o guardião do portão do Tibete
 
Como a maior parte das figuras mitológicas dos fundadores de religiões, a vida do escritor do Tao Te Ching, Lao Tzu, é envolta em lendas. Segundo a tradição, Lao Tzi nasceu no sul da China cerca de 604 a.C, tendo sido superintendente judicial dos arquivos imperiais em Loyang, capital do estado de Ch'u. Desgostoso pelas intrigas da vida na corte, Lao Tzi decidiu afastar-se da sociedade, seguindo para as Terras do Oeste. Montado em uma carroça guiada por um boi, seguiu viagem, mas, ao atravessar a fronteira, um dos seus amigos, o policial Yin-hsi, o reconheceu e lhe pediu que escrevesse seus ensinamentos antes de partir. Lao Tzi, então, escreveu o pequeno livro conhecido posteriormente como Tao Te Ching e partiu em seguida. Segundo a história, morreu em 517 a.C. Lao Tzi foi canonizado pelo imperador Han entre os anos 650 a.C. e 684 a.C

domingo, 23 de novembro de 2014

Acreditar


 
 


O trabalho do jornalista não é acreditar em qualquer coisa, mas ser cético. Contudo, há algumas coisas (poucas) nas quais um jornalista acredita piamente. Uma delas: por maior que seja o poder de uma maioria há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não.




 

sábado, 22 de novembro de 2014

JFK






Gore Vidal conta que uma vez, numa festa onde estava com Tennessee Williams, passou por eles o jovem senador Kennedy cuja visão inspirou ao dramaturgo o seguinte comentário: "que belo traseiro!".

domingo, 16 de novembro de 2014

Decência e honestidade


Acho que precisamos limitar gastos. De forma séria e permanente, com o firme propósito de organizar o estado caótico das finanças públicas sem aumentos de impostos. Também defendo a medida culturalmente, para chamar a atenção dos brasileiros para a necessidade de uma vida mais simples, sem desvarios de grandeza, de luxos que não estão ao alcance de todos.
 
Estou cansada de ver, de um lado, a gastança, o enriquecimento ilícito e o desperdício e, do outro, a carência, a falta de saúde e a pobreza. É muita desigualdade. Como entender o custo das campanhas eleitorais no Brasil? Nada que diz respeito a isso parece compatível com a realidade. As cifras  envolvem valores tão elevados que parecem saídos de algum filme de ficção matemática. Surreal.

Moro em Brasília, pago todos os meus impostos e tenho usufruído das vantagens que a capital do país confere a seus cidadãos. Não posso deixar de reconhecer, contudo, que a cidade não parece de verdade, tamanhas as benesses concedidas à sua casta de privilegiados.  Como justificar a aposentadoria integral do serviço público brasileiro, em valores assombrosos até para países riquíssimos como a Alemanha e os Estados Unidos? 

Aqui, uma minoria vive melhor do que muitos príncipes de verdade, enquanto a maioria amarga a descrença e o dissabor de ter nascido em um dos países mais injustos do mundo.  A propósito: proporcionalmente, nenhuma monarquia no mundo custa tanto quanto Brasília. Nem Mônaco. Muito menos a poderosa Inglaterra. A diferença é que as monarquias do lado de lá existem de fato e são bancadas por uma população de elevada renda per capita.

No Brasil, a fieira de privilégios dos príncipes de araque (que existem em todos os estados e não apenas em Brasília) pesa sobre a maioria da população que não pode dispor de boas escolas públicas para seus filhos, não conta com planos de saúde e muito menos com aposentadoria na velhice. O fato é que a massa de vulneráveis brasileiros (37% da população) sobrevive com muito pouco.

Embora o país disponha de recursos naturais em proporção adequada, a dura  verdade é que nosso desenvolvimento econômico não deslancha e a economia nunca cresce como deveria, ou como poderia. Avançamos um pouco nas últimas três décadas mas, infelizmente, ainda não garantimos vida digna à maioria da população e os avanços estão sendo corroídos pela corrupção, crise moral e descrença.
 
Todos os partidos se elegem  prometendo inibir a gastança pública e a roubalheira, mas o resultado na prática é a corrupção desenfreada e o aumento dos enriquecimentos inexplicáveis de líderes políticos que nada fazem para mudar a realidade. Como exigir decência ao povo de vida modesta se os líderes dos escalões superiores atuam com a mais indecente e descarada desonestidade?
 

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Ainda assim, eu levanto



Ainda assim, eu levanto

Maya Angelou (1928 - 2014)

Você me relega ao passado,
e pode mentir um tanto,
pode me jogar na lama,
como poeira, eu levanto.

Minha petulância dói?
Tristinho você se cala?
Ando como se tivesse
Petróleo na minha sala.
Como a lua e como o sol,
Como a maré por encanto,
Como a esperança que nasce,
Eu levanto.

Você quer me ver caído,
Cabeça baixa, quebranto,
Ombros moles como um choro,
Alquebrado pelo pranto?
Minha altivez o ofende?
Não me leve tão a mal,
Porque eu rio por ter minas
De ouro no meu quintal.

Vem me ferir com palavras,
O seu olhar me cortando,
Vem me matar com seu ódio,
Mas como o ar, eu levanto.

Meu desejo o transtorna?
E lhe surpreende tanto
Que eu dance com diamantes
Entre as coxas que eu levanto?
Dos barracões da História,
Eu levanto

De um passado que é só dor
Eu levanto
Sou um oceano negro, de pé,
Subindo e transbordando na maré.
Deixando pra trás as noites de medo
Eu levanto

Na clara manhã, ainda bem cedo,
Eu levanto
Os dons dos meus ancestrais alinhavo,
Sou o sonho e a esperança do escravo.
Eu levanto
Eu levanto
Eu levanto.

tradução Jorge Pontual

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Para um amigo de verdade...


 

 

Não tenho respostas
para as tuas dúvidas ou temores,
mas posso ouvir-te
e compartilhar contigo
as incertezas da vida
Não posso mudar
o teu passado
ou o teu futuro,
mas quando necessitares de mim
estarei sempre aqui
 
As tuas alegrias, os teus triunfos
e os teus êxitos não são os meus,
mas desfruto sinceramente
de grande felicidade
quando te vejo feliz...

Não posso evitar o teu sofrimento
nem impedir que alguma mágoa
parta o teu coração,
mas posso chorar contigo
e torcer para que você volte
a acreditar novamente...

Não posso voltar o tempo
nem decidir quem você foi,
somente posso amar-te como és.
"Amizade é amor que nunca morre".  
Muito obrigada por você ser 
o amigo de verdade que você é.  
Conte sempre comigo.



 
 
 
 


terça-feira, 21 de outubro de 2014

Querida Miriam Leitão



Querida Miriam Leitão!

Por que lhe escrever uma carta? Para lhe dizer que graças a pessoas corajosas como você, que lutam por democracia e liberdade, ninguém ainda se tornou dono do Brasil. Você faz da análise e da divulgação dos fatos a sua ação política. Uma ação realizada com grandeza, sentido público e sem ressentimentos. O trabalho é político porque se dirige ao público e onde há um coletivo há política.
Sua forma de ação, no entanto, vai muito além de qualquer militância partidária. Como disse Fernando Pessoa, “só há uma coisa que faz sentir ao governante que não pode abusar: é a presença sensível, quase corpórea, de uma opinião pública direta, imediata, espontânea (...), que todos os povos sãos possuem”.

Além de errada e ridícula, a ilusão de dominar um país é autoritária, antes de se tornar progressivamente criminosa. O discurso de um político, seja de que partido for, não pode ameaçar, intimidar ou sufocar as antenas sociais e humanas de um país. E você sempre será uma das nossas antenas mais sensíveis e mais brilhantes.

Por meio do jornalismo, você luta diariamente contra a falta de informação e de discernimento. Faz isso com firmeza. Nunca lhe interessou a fuga, interessa-lhe o confronto, o embate e a clareza, ainda que no escuro mais ameaçador.
Um político no poder pode achar que pode muito, mas não pode achar que o trabalho dele não é ouvir o que um cidadão, ou uma cidadã, tem a lhe dizer. É para ouvir o que as pessoas têm a dizer que os políticos são eleitos. 
Nossa história está em um momento penoso de dramatização populista, de insinuação. Por detrás disso está o medo. O medo da própria democracia e do jogo claro que ela devia impor e tornar necessário. O medo é sempre perigoso e reacionário.

Costumo dizer aos seus filhos queridos, e tão amados, os jornalistas Vladimir e Matheus, que pessoas como você vieram de outro planeta para nos mostrar que é possível viver com força, disposição e coragem.  Dá gosto dizer seu nome na frente deles e verificar, quase no mesmo instante, o brilho que surge nos olhos dos seus meninos.
Um grande e afetuoso abraço,

Vanda Célia

 

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Eu e a aposentadoria



Fazer alguma coisa é mesmo melhor que não fazer nada? De repente, fiquei com vontade de tirar um ano de folga, ou ano sabático, como uma espécie de treinamento para a aposentadoria. Isso vai obrigar-me a repensar o modo de vida e a forma como lido com as coisas mais banais: o preço do remédio da pressão, as compras na feira, as compras de Natal, a mania de ter novos sapatos e as idas a restaurantes.

Sou muito desligada da vida prática. Não fico fazendo contas e nem pechinchando. Com a aposentadoria, no entanto, dificilmente poderei encarar o futuro com a mesma leviandade da minha vida de antes, quando os bons ganhos sustentavam quase todos os desejos de consumo.

Se abrir mão do salário que tenho, vou ganhar bem menos. Isso significa ficar mais pobre. É ruim? Bom não é, mas acredito, sinceramente, que não será de todo mau. Penso que posso até enxergar alguma vantagem, se tiver algum tempo para ficar de pernas para o ar.

Não gosto de queixar-me, mas, a prosperidade sempre me custou muito em energia e em desgaste emocional. Como a maioria da minha geração, trabalhei duro. Nunca tirei férias de 30 dias (no máximo 20). Depois de tantos anos no batente. acho que faço jus a alguns períodos de folga.

Voltarei a ser uma pessoa de gastos mais simples e, provavelmente, com um estoque menor de ilusões. O poder de compra garante muitas alegrias e ilusões. Ok, tudo bem, ninguém morre de tristeza se é obrigado a andar por aí usando um casaco com cotoveleiras.

O que realmente importa é a vida que conseguimos construir, os livros que temos de ler e de reler, as músicas que vamos cantarolar, os amigos com quem queremos conversar e as nossas doces lembranças. Assim serão os anos que vêm.

domingo, 5 de outubro de 2014

Um Salve à Cidadania!


5 de outubro 2014 - Eleições e Cidadania
Celebrar o Brasil hoje e sempre para prestar a justa homenagem aos que baniram a ditadura,  resgataram a democracia e, com sua ação, restituíram aos brasileiros a liberdade individual e a liberdade enquanto povo soberano.

Celebrar o Brasil para nos lembrarmos todos, mas, em especial, para lembrar aos mais novos que a liberdade é resultado da vontade e da ação paciente e persistente do homem e das instituições.

Celebrar o Brasil para refletir sobre o momento que vivemos. Só as sociedades capazes de uma reflexão sistemática sobre sua realidade, histórica e presente, realizam as reformas necessárias ao avanço de sua gente.
Celebrar o Brasil para assinalar que a Democracia não é aquisição definitiva, mas fruto do nosso esforço e do nosso compromisso diário com a liberdade e os valores da cidadania.

E, finalmente, celebrar o Brasil para não esquecer as personalidades e as organizações civis que, ao longo de décadas, se bateram pela Justiça e a equidade. 

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Querida Giovana!

 
Desde o dia especial em que você rasgou o ventre de sua Mãe e chegou ao mundo não canso de pensar que, mesmo sendo um bebê, você renovou a esperança e a confiança no futuro de todos da família. Seus gritinhos insistentes (ou seriam  exigentes?) mudaram nossa vida e fizeram com que nossos corações passassem a bater com mais força e mais coragem.

Seus olhos são azuis, seu cabelo cai em cachos por sua testa. É como se Deus nos tivesse enviado um anjo de rara beleza. Tanto a vida, como o tempo, são atravessados pelos ciclos, uns de sombra, outros de luz e muitos de escuridão. Ao chegar na família, você inaugurou um ciclo de luz.

Lembro o momento que te vi pela primeira vez. Sua mãe estava na maca, saindo da sala de cirurgia. Ela segurava você nos braços e, com todo o cuidado, cobria seus olhos com uma das mãos para impedir que a claridade te assustasse. Ao lado da maca, protegendo você e sua mãe, vinha seu pai, com um sorriso enorme espalhado pelo rosto.

Você nasceu no dia do aniversário do seu avô, Alberto. Desde então, ele mudou. De ateu degenerado, seu avô passou a acreditar em astrologia, numerologia, ligações interplanetárias e até em vidas passadas, mesmo sabendo que elas não contam tempo para a aposentadoria.

“Minha neta e eu nascemos em um mesmo dia, somos de um mesmo signo e isso é um sinal”, ele disse. “Sinal de que você, seu tolinho, nunca mais terá festa de aniversário”, pensei. Ainda bem que seu avô não lê pensamento. Digo “ainda” porque desde o teu nascimento ele está cada vez mais animado,  confiando que pode mais. E sorridente, muito sorridente. A pessoa ficou insuportavelmente feliz...

Nunca vi seu avô tão metido, como se o tempo não tivesse passado e ele ainda fosse o jovem que conheci há 35 anos. Nessa batida, ele acabará acreditando que pode até ler pensamentos. Deus me livre! E guarde! Isso não pode acontecer. É que sua avó tem alguns segredos. Sim, é verdade e não  há mal nisso.

Um adulto tem entre 40 e 60 mil pensamentos por dia, não tem problema guardar uma parte deles só para a gente. Seríamos todos loucos se nosso cérebro tivesse de processar todos os pensamentos conscientemente. Por essa razão, a maior parte deles funciona automaticamente e nem aparece no índice de eventos do nosso dia. Esse assunto, porém, exige muitos cuidados....

Não é bom deixar qualquer um conhecer seus pensamentos. As coisas que a gente pensa, ou mesmo as que a gente pensou um dia, não devem ser assunto de conversa com ninguém. O processo de pensar e de proteger o nosso pensamento, faz parte do que chamamos de nossa personalidade, nosso ser interior.

Daqui a pouco você entenderá um pouco mais sobre a dádiva divina de ser uma pessoa única em todo o universo. Entenderá, igualmente, que é sábio ser justo e tolo mentir. Não precisa sair por aí contando tudo a todos, apenas cuide para que só palavras verdadeiras possam sair de sua boca.

Vamos voltar a falar disso um dia. Agora, dorme e brinca. Você inda nem fez quatro anos. Haverá tempo para tudo. Sei que seu futuro será brilhante, como o da sua Mãe e do seu Pai, de quem, certamente, você receberá os traços de caráter, a teimosia, a lucidez e a força de vontade.

De sua mãe desejo que você receba o senso de justiça e o compromisso com a verdade. De seu pai, o legado da bondade, da capacidade de perdoar, de amar e de acreditar. Eu e seu avô esperamos deixar boas lembranças em sua memória.

Acredito que estamos cumprindo bem nosso papel como seres humanos. Tivemos o privilégio de ter sua mãe como nossa filha. Foi ela que nos ensinou a viver com mais amor e mais generosidade. Não há como quitar uma dádiva dessas. 

Então é isso minha neta, vendo sua mãe te educar  com tanto afeto penso que ninguém precisa de nada, além do que você já tem, para ser feliz.

Um grande beijo da sua avó.

 

domingo, 28 de setembro de 2014

"Ninguém sabe o que sou quando rumino"

          
Hoje, 28 de setembro, faz 106 anos que morreu Machado de Assis, um dos maiores escritores de todos os tempos. Inquieto, lúcido, irônico, Machado escrevia como  filósofo, mas tinha humor e estilo, principalmente quando empenhava-se  em fazer uma digressão, definir com precisão um gesto, ou um detalhe qualquer, como se escrever também pudesse ser brincadeira leve e descontraída.
 
"Ninguém sabe o que sou quando rumino", costumava dizer este gênio brasileiro que nasceu na pobreza, tinha pele mestiça e que teve de batalhar cada milímetro dos avanços que conquistou na vida.  Fundador da Academia Brasileira de Letras, deixou uma obra literária monumental.
Quem não se pergunta de vez em quando se Capitu (Dom Casmurro) foi mesmo uma adúltera? E quem não se lembra do anárquico Brás Cubas e da dedicatória de suas memórias, em louvor "ao verme que primeiro roeu as frias carnes de meu cadáver"?
É famosa a passagem do livro Esaú e Jacó em que o dono da Confeitaria do Império tem o azar de mandar pintar uma nova tabuleta para seu estabelecimento justamente às vésperas da proclamação da República. E agora, que fazer? Trocar o nome para Confeitaria da República? Mas... e se sobreviesse nova reviravolta política? Uma idéia foi adotar o nome "Confeitaria do Governo". Mas, nesse caso, as oposições não poderiam vir a apedrejá-la? O jeito foi rebatizar a casa com o nome do proprietário. Virou a "Confeitaria do Custódio". É isso, Machado é uma maravilha...
 

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Evangelho segundo São Mateus






Evangelho segundo São Mateus

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos a seguinte parábola: «O reino dos Céus pode comparar-se a um pro­prie­tário, que saiu muito cedo a contratar trabalhadores para a sua vinha. Ajustou com eles um denário por dia e mandou-os para a sua vinha. Saiu a meia-manhã, viu outros que estavam na praça ociosos e disse-lhes: ‘Ide vós também para a minha vinha e dar-vos-ei o que for justo’. E eles foram. Voltou a sair, por volta do meio-dia e pelas três horas da tarde, e fez o mesmo. Saindo ao cair da tarde, encontrou ainda outros que estavam parados e disse-lhes: ‘Porque ficais aqui todo o dia sem trabalhar?’. Eles responderam-lhe: ‘Ninguém nos contratou’. Ele disse-lhes: ‘Ide vós também para a minha vinha’. Ao anoitecer, o dono da vinha disse ao capataz: «Chama os trabalhadores e paga-lhes o salário, a começar pelos últimos e a acabar nos primeiros’. Vieram os do entardecer e receberam um denário cada um. Quando vieram os primeiros, julgaram que iam receber mais, mas receberam também um denário cada um. Depois de o terem recebido, começaram a murmurar contra o proprietário, dizen­do: ‘Estes últimos trabalharam só uma hora e deste-lhes a mesma paga que a nós, que suportámos o peso do dia e o calor’. Mas o proprietário respondeu a um deles: ‘Amigo, em nada te prejudico. Não foi um denário que ajustaste comigo? Leva o que é teu e segue o teu caminho. Eu quero dar a este último tanto como a ti. Não me será permitido fazer o que quero do que é meu? Ou serão maus os teus olhos porque eu sou bom?’. Assim, os últimos serão os primei­ros e os primeiros serão os últimos».
 
Da Bíblia Sagrada

domingo, 21 de setembro de 2014

Os Dez Cantos d'Os Lusíadas



É sério: um ser humano pode ser considerado "inculto" em Portugal por não saber o número de cantos dos Lusíadas. É suposto que será avaliado como "culto" se tiver lido o poema épico de Luís de Camões, publicado em 1572 . Mesmo não concordando com essa medida ilusória de conhecimento, estou postando o resumo de cada um dos dez cantos deste texto monumental. Para ler na íntegra, ou baixar o conteúdo grátis: http://bit.ly/1ylwDfl

Os Dez Cantos d'Os Lusíadas
 
O poeta indica o assunto global da obra, pede inspiração às ninfas do Tejo e dedica o poema ao Rei D. Sebastião. Na estrofe 19 inicia a narração de viagem de Vasco da Gama, referindo brevemente que a Armada já se encontra no Oceano Índico, no momento em que os deuses do Olimpo se reúnem em Concílio convocado por Júpiter, para decidirem se os Portugueses deverão chegar à Índia.
Com o apoio de Vénus e Marte e apesar da oposição de Baco, a decisão é favorável aos Portugueses que, entretanto, chegam à Ilha de Moçambique. Aí Baco prepara-lhes várias ciladas que culminam com o fornecimento de um piloto por ele instruído para os conduzir ao perigoso porto de Quíloa. Vénus intervém, afastando a armada do perigo e fazendo-a retomar o caminho certo até Mombaça. No final do Canto, o poeta reflete acerca dos perigos que em toda a parte espreitam o Homem.
 
O rei de Mombaça, influenciado por Baco, convida os Portugueses a entrar no porto para os destruir. Vasco da Gama, ignorando as intenções, aceita o convite, pois os dois condenados que mandara a terra colher informações tinham regressado com uma boa notícia de ser aquela uma terra de cristãos. Na verdade, tinham sido enganados por Baco, disfarçado de sacerdote. Vénus, ajudada pelas Nereidas, afasta a Armada, da qual se põem em fuga os emissários do Rei de Mombaça e o falso piloto.
Vasco da Gama, apercebendo-se do perigo que corria, dirige uma prece a Deus. Vénus comove-se e vai pedir a Júpiter que proteja os Portugueses, ao que ele acede e, para a consolar, profetiza futuras glórias aos Lusitanos. Na sequência do pedido, Mercúrio é enviado a terra e, em sonhos, indica a Vasco da Gama o caminho até Melinde onde, entretanto, lhe prepara uma calorosa recepção. A chegada dos Portugueses a Melinde é efectivamente saudada com festejos e o Rei desta cidade visita a Armada, pedindo a Vasco da Gama que lhe conte a história do seu país.
 
Após uma invocação do poeta a Calíope, Vasco da Gama inicia a narrativa da História de Portugal. Começa por referir a situação de Portugal na Europa e a lendária história de Luso a Viriato. Segue-se a formação da nacionalidade e depois a enumeração dos feitos guerreiros dos Reis da 1.ª Dinastia, de D. Afonso Henriques a D. Fernando.
Destacam-se os episódios de Egas Moniz e da Batalha de Ourique, no reinado de D. Afonso Henriques, e o da Formosíssima Maria, da Batalha do Salado e de Inês de Castro, no reinado de D. Afonso IV.
 
Vasco da Gama prossegue a narrativa da História de Portugal. Conta agora a história da 2.ª Dinastia, desde a revolução de 1383-85, até ao momento, do reinado de D. Manuel, em que a Armada de Vasco da Gama parte para a Índia.
Após a narrativa da Revolução de 1383-85 que incide fundamentalmente na figura de Nuno Álvares Pereira e na Batalha de Aljubarrota, seguem-se os acontecimentos dos reinados de D. João II, sobretudo os relacionados com a expansão para África.
É assim que surge a narração dos preparativos da viagem à Índia, desejo que D. João II não conseguiu concretizar antes de morrer e que iria ser realizado por D. Manuel, a quem os rios Indo e Ganges apareceram em sonhos, profetizando as futuras glórias do Oriente. Este canto termina com a partida da Armada, cujos navegantes são surpreendidos pelas palavras profeticamente pessimistas de um velho que estava na praia, entre a multidão. É o episódio do Velho do Restelo.
 
Vasco da Gama prossegue a sua narrativa ao Rei de Melinde, contando agora a viagem da Armada, de Lisboa a Melinde.
É a narrativa da grande aventura marítima, em que os marinheiros observaram maravilhados ou inquietos o Cruzeiro do Sul, o Fogo de Santelmo ou a Tromba Marítima e enfrentaram perigos e obstáculos enormes como a hostilidade dos nativos, no episódio de Fernão Veloso, a fúria de um monstro, no episódio do Gigante Adamastor, a doença e a morte provocadas pelo escorbuto. O canto termina com a censura do poeta aos seus contemporâneos que desprezam a poesia.
 
Finda a narrativa de Vasco da Gama, a Armada sai de Melinde guiada por um piloto que deverá ensinar-lhe o caminho até Calecut.
 
Baco, vendo que os portugueses estão prestes a chegar à Índia, resolve pedir ajuda a Neptuno, que convoca um Concílio dos Deuses Marinhos cuja decisão é apoiar Baco e soltar os ventos para fazer afundar a Armada. É então que, enquanto os marinheiros matam despreocupadamente o tempo ouvindo Fernão Veloso contar o episódio lendário e cavaleiresco de Os Doze de Inglaterra, surge uma violenta tempestade.
Vasco da Gama vendo as suas caravelas quase perdidas, dirige uma prece a Deus e, mais uma vez, é Vénus que ajuda os Portugueses, mandando as Ninfas seduzir os ventos para os acalmar.
Dissipada a tempestade, a Armada avista Calecut e Vasco da Gama agradece a Deus. O canto termina com considerações do Poeta sobre o valor da fama e da glória conseguidas através dos grandes feitos.
 
A Armada chega a Calecut. O poeta elogia a expansão portuguesa como cruzada, criticando as nações europeias que não seguem o exemplo português. Após a descrição da Índia, conta os primeiros contactos entre os portugueses e os indianos, através de um mensageiro enviado por Vasco da Gama a anunciar a sua chegada.
O mouro Monçaíde visita a nau de Vasco da Gama e descreve Malabar, após o que o Capitão e outros nobres portugueses desembarcam e são recebidos pelo Catual e depois pelo Samorim. O Catual visita a Armada e pede a Paulo da Gama que lhe explique o significado das figuras das bandeiras portuguesas. O poeta invoca as Ninfas do Tejo e do Mondego, ao mesmo tempo que critica duramente os opressores e exploradores do povo.
 
Paulo da Gama explica ao Catual o significado dos símbolos das bandeiras portuguesas, contando-lhe episódios da História de Portugal nelas representados. Baco intervém de novo contra os portugueses, aparecendo em sonhos a um sacerdote brâmane e instigando-o através da informação de que vêm com o intuito da pilhagem.
O Samorim interroga Vasco da Gama, que acaba por regressar às naus, mas é retido no caminho pelo Catual subornado, que apenas deixa partir os portugueses depois destes lhes entregarem as fazendas que traziam. O poeta tece considerações sobre o vil poder do ouro.
 
Após vencerem algumas dificuldades, os portugueses saem de Calecut, iniciando a viagem de regresso à Pátria. Vénus decide preparar uma recompensa para os marinheiros, fazendo-os chegar à Ilha dos Amores. Para isso, manda o seu filho cúpido desfechar setas sobre as Ninfas que, feridas de Amor e pela Deusa instruídas, receberão apaixonadas os Portugueses.
A Armada avista a Ilha dos Amores e, quando os marinheiros desembarcam para caçar, vêem as ninfas que se deixam perseguir e depois seduzir. Tétis explica a Vasco da Gama a razão daquele encontro(prémio merecido pelos “longos trabalhos”), referindo as futuras glórias que lhe serão dadas a conhecer. Após a explicação da simbologia da Ilha, o poeta termina, tecendo considerações sobre a forma de alcançar a Fama.
 
As Ninfas oferecem um banquete aos portugueses. Após uma invocação do poeta a Calíope, uma ninfa faz profecias sobre as futuras vitórias dos portugueses no Oriente. Tétis conduz Vasco da Gama ao cume de um monte para lhe mostrar a Máquina do Mundo e indicar nela os lugares onde chegará o império português. Os portugueses despedem-se e regressam a Portugal.
O poeta termina, lamentando-se pelo seu destino infeliz de poeta incompreendido por aqueles a quem canta e exortando o Rei D. Sebastião a continuar a glória dos Portugueses.