domingo, 31 de dezembro de 2017

Cadê os outros?


No Brasil de hoje temos dezenas de pessoas investigadas (muitas condenadas e algumas presas) por crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e todos os tipos de desvios dos fundos públicos.

Além de dizer que neste álbum histórico estão muitos nomes e fotos da "elite" nacional, lamento assinalar a estranha exceção do Judiciário, da polícia e dos altos funcionários públicos que foram omissos na fiscalização, prevenção ou denúncia da roubalheira.

Já que aparentemente houve tanto cuidado em juntar o maior número possível de figuras públicas de diversas áreas, por que foram incluídas fotos de mais setores institucionais do que de outros? Não estou criticando, estou lamentando as ausências que são muitas e injustificáveis.

Sei que a Lava-Jato é uma benção no país da impunidade, mas acredito que neste caso, e logo desde o início, criou-se e deixou-se alastrar pela opinião pública a ideia de que por trás dos crimes de corrupção estavam apenas os "políticos poderosos".

E, sendo "poderosos", convinha que tivessem rostos conhecidos.  Assim, o álbum foi aparentemente limitado às figuras e os rostos que as televisões, as revistas e os jornais mostram.

O mundo da magistratura, onde alguns sempre olharam para a política com um misto de inveja e de ressentimento, passou a exercer o poder de arruinar, com gosto e naturalidade, a reputação de algumas das figuras públicas mais conhecidas do Legislativo e do Executivo.  

Ao consentir na orientação da investigação neste sentido, viram aqui mais uma oportunidade para "limpar" um "sistema" que intimamente desprezam.    

Não quero dizer que muitos políticos não dão motivo para a maldição pública. O que quero dizer é que no meio disto tudo, porém, existem seguramente vítimas de um crime concreto.

E não sabemos se os criminosos, os verdadeiros, vão ter o seu castigo ou se os inocentes vão ser absolvidos. O que acho é que a legítima indignação de muitos se confundiu demasiadas vezes com a demagogia sensacionalista de alguns.

Acho ainda que falta  credibilidade e "serenidade"  em alguns líderes da investigação. Ver um procurador de dedo em riste no Jornal Nacional investindo contra todos os poderes da República não pode ser sinal de avanço. É, no mínimo, excesso de parcialidade.

Tudo visto e ponderado, estou certa de que uma justiça "justa" jamais poderá ser aquela que se apoia, seja de forma ingênua ou mesmo de maneira convicta, no triunfo do recalcado.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Natal



Estrela de Belém e dos pastores
Lava da alma humana as suas dores...

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

UTOPIAS ANTIPOLÍTICAS!

 
 
Por Angela Alonso - Iustríssima- FSP, 17 
 
1.  Versão notável desse tipo de utopia é a da empresa Seasteading Institute, fundada em 2008 por um empreendedor de tecnologia e um engenheiro de softwares. O segundo é neto de Milton Friedman, assegurando o DNA liberal.
 
2. A organização abandonou os "sistemas políticos obsoletos" em favor de "cidades flutuantes que permitirão à próxima geração de pioneiros testar pacificamente novas ideias de como viver em comunidade." Bem-sucedidas, disseminarão a "mudança", abolindo os Estados.
  
3. Este novo utopismo tem geografia móvel: ilhas artificiais ancoradas em alto-mar. Assim, se insatisfeitas com a vizinhança, levantariam âncora em vez de guerrear. O residente também se livraria do Estado, cabendo a gestão a especialistas. Escaparia do aborrecimento com políticos, tornando-se cliente de um serviço.
  
4. Essa utopia antipolítica concretiza o que pensam muitos: que políticos são parasitas ineficientes e dispensáveis, assim como tudo que os cerca —as Constituições, as instituições políticas, as candidaturas e os votos.
  
5. Tal negação extrema da política tem correspondentes no debate brasileiro. A opinião, as redes e as mídias entronizaram o mercado, com seu princípio de eficiência. Ao mesmo tempo, subiu na consideração popular um Poder não eleito: o Judiciário, único guardião da coisa pública, mais capaz e confiável que os políticos. Produziu-se verdadeira glamorização de juízes e promotores, com livros, eventos, filmes, séries, homenagens e prêmios aos "heróis" da Lava Jato.
   
6. O prestígio se estendeu para a Polícia Federal. O empoderamento público da corporação começou jocoso, com o "japonês" que conduzia políticos acusados de corrupção e o culto a policiais-musos. E se assentou na equação "justiça igual a prisão" —apesar de nossa população carcerária ser a terceira no ranking mundial.
   
7. Em princípio, como diz o nome do filme —"Polícia Federal: A Lei é para Todos"—, a regra independe de a quem se aplique. Mas como tudo se interpreta, uns são inocentados e outros aprisionados, conforme as conveniências.
   
8. Essa moralidade antipolítica incita uma lógica da exclusão e anima o milhão de pessoas que foi ao cinema prestigiar a PF e aqueles que aderem à candidatura presidencial de um militar.  E é o que legitima as idas da polícia aos campi de universidades públicas, onde muitos discordam dos partidários da utopia antipolítica.
   
9. As operações da PF se baseiam na crença sincera de que o combate à corrupção lhe confere um mandato tácito da opinião pública para vigiar e punir. A UFMG foi o caso mais recente de uma série de seis operações em universidades federais. Feriu direitos individuais. Não houve intimação para depor que, desobedecida, justificaria a condução coercitiva.
   
10. Essa ação e suas congêneres se amparam na tese de que o serviço público é ineficaz e corrupto, ao contrário do mundo privado de Seasteading Institute, Odebrecht, Friboi e similares, onde só existiriam pessoas eficientes e de bem. Mas não é bem assim. Em toda parte há joio e trigo, no Estado e no mercado, na universidade e na PF.
   
11. A utopia antipolítica produz um antiestatismo às cegas, que evita a política como esfera de debate entre os divergentes. Ancorados em uma superioridade moral que julgam autoevidente, os novos utopistas excluem, discriminam, impõem. Seus fins justificam seus meios. O apelo à ética respalda a prática da violência.
   
12. Pode parecer distopia, mas, como a ilha do neto de Friedman denota, o pesadelo de uns é justamente a utopia de outros.
 
 

Texto da Folha extraído do Ex-blog de Cesar Maia em 19/12/2017 

sábado, 16 de dezembro de 2017

A pobreza extrema de um país rico nos números do IBGE


Deve saber-se com quem se está e contra quem é preciso travar combate.
Neste momento, qualquer tentativa de consenso político que ignore os dados do IBGE sobre a pobreza no Brasil, seja em que setor for, é um puro equívoco.

De acordo com o Instituto, um quarto da população, ou 52,2 milhões de brasileiros, estava abaixo da linha da pobreza em 2016, conforme parâmetros estabelecidos pelo Banco Mundial no mês passado. Um contingente que corresponde a cinco vezes e pouco a população de Portugal ou a da Grécia, perto de nove vezes a da Dinamarca, ou tanta gente quanto tem a África do Sul.

Desses 52,2 milhões — que viviam com renda domiciliar per capita diária inferior a US$ 5,50 (R$ 387,07 por mês) —, quase 18 milhões eram crianças de zero a 14 anos.

43,1% dos habitantes do Norte e 43,5% dos moradores do Nordeste vivem com renda igual ou inferior a R$400 reais por mês, contra 25,4% da média nacional. Ou seja, quase metade da população das duas regiões.

É difícil fazer brilhar nos olhos dos meus netos alguma  esperança no futuro do País com uma realidade dessas. Uma vez mais, sei que alguma coisa tem de acontecer, qualquer coisa, mesmo eu não sabendo o quê, quando ou como...

Pior é lembrar que nada do que vai acontecer sairá da política tendo em vista a barafunda institucionalizada... E pior ainda é constatar essa necessidade de consenso que muitos defendem.

O objetivo é manter tudo como está? Discordo completamente! Há momentos na vida em que é preciso mudar de lugar, curvar noutra direção e passar a estar num "outro lado" qualquer. Sem consensos.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

"Tenta e fracassa, tenta outra vez e fracassa melhor".


"Uma mulher aborda-me na rua e pergunta-me se sou seu filho. Olho-a por uns segundos e sigo em frente. Já de costas, ouço-a repetir a pergunta. Continuo. Perplexo. Toda a cidade tem os seus loucos, os seus disturbados, os seus perdedores. Eu não quero fantasiar: a loucura é caso clínico e não traz glória. Mas o fracasso, amigos, o fracasso, a derrota humana têm um esplendor profundo e imaterial que eu admiro. Admiro intensamente os que fracassam, os que perdem. O fracasso é infinitamente preferível à vitória. Quem perde, ganha uma angústia metafísica, uma compaixão existencial. Merece respeito. E merece ainda mais respeito se perde de propósito, se é um perdedor nato e intencional. Os vencedores aborrecem-me, escandalizam-me, oprimem-me. Não exalam uma única vergonha, um único constrangimento, uma única incerteza. E são cinicamente inverosímeis no seu brilho estudado e elefantino. Meias da cor dos sapatos, sapatos da cor das calças, cuecas da cor da gravata. Uma voz segura, um perfil de estátua. Os vencedores sabem o que dizer, o que fazer, o que esperar. E permanecem sempre os mesmos, aconteça o que acontecer. Se tivesse coragem, digo-vos que fracassaria com afinco todos os dias. É muito mais saudável perder do que ganhar. Ganhar é um luxo, uma embriaguez fácil, uma descaracterização. Fracassar não é nada disso. Fracassar é muito mais difícil, muito mais exigente e muito mais conservador do que ganhar. É a única utopia conservadora em que eu acredito: a utopia do fracasso. Tenho há muito tempo esta certeza e não me peçam para explicar: o mundo será melhor no dia em que for universalmente feito de fracassados".

"Fracassar é preciso", de Pedro Lomba
Título: Frase de Samuel Beckett    

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Um novo ano está chegando...


Em 2018, como todos os otimistas, espero mais sensatez e normalidade. E torço por um projeto coletivo que seja razoável, mobilizador e equilibrado.

O desânimo de alguns é profundo, mas os lamentos sobre a nossa desigualdade não ajudam. Não adianta insistir em  diagnósticos sobre a nossa cultura de maus tratos aos mais pobres, que dependem do Estado. 

Convém trabalhar pela responsabilidade social e defender líderes políticos com sensibilidade, capazes de enxergar a dor do outro. 

A confiança no poder e nas instituições é básica, se quisermos ter um mínimo de respeito pelo Estado. Confiança se conquista com decência, capacidade e racionalidade.

Vamos tentar fazer com que a política nos ajude a tornar-nos mais donos da nossa vida, mais responsáveis pelo nosso País. Nesse sentido, convém que cada um de nós faça mais do que tem feito.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Lula

Lula faz política há mais de 50 anos. Tornou-se mestre na arte do paradoxo político: consegue dizer sempre mais do que realmente diz e tem sido dono de uma rara capacidade de fazer dos seus defeitos “extraordinárias virtudes”, como ele costuma dizer. 
 
Lula também pode ser definido pela resiliência – está em campanha pela Presidência da República pela sexta vez, apesar de condenado na Lava-jato em primeira instância e de enfrentar uma fieira de outros processos na Justiça.
 
Não se pode negar que ele se alimenta e se realimenta de algumas características do caráter nacional: a capacidade de reverter adversidades; a complacência com o erro, a recusa ao mérito e o silêncio sobre toda e qualquer qualidade dos adversários.
 
Se Getúlio Vargas foi nosso político mais protetor e autoritário; JK o mais solar e avançado; Tancredo o mais conciliador  e FHC o mais diplomático, Lula é irrecusavelmente o mais brasileiro. Para o bem e para o mal. Com tudo que isso significa. 

domingo, 3 de dezembro de 2017

Questão democrática

Li e reli a pesquisa Datafolha que aponta Lula na ponta e Jair Bolsonaro isolado em segundo lugar. Fiquei pensando: o que une Lula e Bolsonaro? 
 
Resposta mais plausível:  os dois são produtos da democracia que construímos. Sim, somos nós, todos nós, os responsáveis pelos resultados políticos que estamos colhendo.

Não há inocentes na política brasileira ou na política de qualquer lugar do mundo.  
Esta verdade, contudo, parece incomodar profundamente alguns democratas que, ultimamente, estão assinalando a natureza maléfica destas duas candidaturas.
 
Posso até concordar com as advertências sobre isso, mas não posso deixar de lembrar que as pesquisas  indicam, até aqui, que a maioria do povo está com eles. E, parece se inclinar para garantir que os dois passem para um duelo direto, em caso de uma segunda volta da corrida presidencial de 2018.
 
Se os demais candidatos não parecem capazes de reunir forças e argumentos para mudar o cenário, das duas; uma: mudamos de povo ou continuamos acreditando na democracia?
 
PS: Não se ofenda, por favor, é só uma pergunta...

sábado, 2 de dezembro de 2017

Nada me espanta

O sorteio da copa não me espanta. Brasil x Alemanha não me espanta. Bolsonaro no topo das pesquisas não me espanta. Nada  me espanta. Estou me tornando descrente até aos ossos.
 
Hoje, reli Nelson Rodrigues. Passo a citá-lo:
 
(...) “no passado, eram os "melhores" que faziam os usos, os costumes, os valores, as ideias, os sentimentos etc…etc…
 
(...) “E, de repente, tudo mudou. No presente mundo, ninguém faz nada, ninguém é nada, sem o apoio dos cretinos de ambos os sexos. Sem esse apoio, o sujeito não existe, simplesmente não existe”…
(...) “E, para sobreviver, o intelectual, o santo ou herói, precisa imitar o idiota. O próprio líder deixou de ser uma seleção. Hoje, os cretinos preferem a liderança de outro cretino.»
Por questão de príncipio, discordo de Nelson Rodrigues quando ele se refere a outras pessoas como "idiotas" e/ou "cretinos". Essas são palavras que ninguém devia usar para se referir a outros seres humanos.      
De todo modo, devo reconhecer que seu texto forte continua ecoando. E, para alguns, com verdade e atualidade, apesar do estilo duro e indigesto.