A sucessão
presidencial vem aí o que acentuará a má vontade, a desinformação e
a preguiça ideológica com os
conservadores — apontados como autoritários, insensíveis, fascistas e
até neonazistas, entre outros equívocos de costume. João
Pereira Coutinho, escritor e brilhante jornalista português, é autor da
melhor definição/conceito sobre a palavra:
"Conservadorismo é,
antes de tudo, uma «disposição» filosófica, para usar o termo feliz de Michael
Oakeshott - o maior filósofo conservador do século XX e um dos maiores
pensadores de toda a história das ideias políticas. É isso que o distingue do liberalismo,
ou do socialismo, mais facilmente sistematizados num cardápio político e
prático."
Um
conservador é alguém que possui uma disposição conservadora baseada na fruição e na resistência à mudança. A fruição nasce diretamente do conceito
temporal essencial para um conservador: não o passado (como para um
reacionário), não o futuro (como para um revolucionário) - mas O PRESENTE.
O
conservador estima o presente porque ele tende a desfrutar aquilo que existe e
não necessariamente aquilo que ele desejaria que existisse. O
conservador lida com a realidade, não com o desejo. Prefere o familiar
ao desconhecido; o tentado ao nunca tentado; o fato ao mistério; o atual ao
possível; o limitado ao ilimitado; o próximo ao distante; o conveniente ao
perfeito; a gargalhada presente à promessa utópica.
Para um
conservador, é preferível manter do que adquirir, cultivar do que alargar. Isto
está diretamente ligado com o problema da mudança. Não que o conservador seja
contrário à mudança. Como diria Burke, uma sociedade que não sabe mudar não se
sabe conservar. Mas, ao contrário de um revolucionário - de esquerda ou de
direita -, um conservador sabe que em cada mudança existe uma perda. Por vezes,
uma perda brutal e irreparável. Tanto que só abraça entusiasticamente a
mudança quem, no essencial, nada tem para preservar.
O
conservador define-se pelo ceticismo racional. E pela prudência.
Naturalmente que algumas mudanças são inevitáveis para a continuidade da
aventura humana, mas o conservador prefere alterações graduais,
lentas, cautelosas, capazes de respeitar os arranjos sociais que resistiram ao
teste do tempo.
Em
termos estritamente políticos, esta «disposição» não tem nada que ver com a lei
natural ou com uma ordem providencial; nada que ver com a moral ou a religião.
Politicamente,
interessa a um conservador ter bem presente que o exercício do governo é uma
atividade específica e limitada: ele sabe que é necessário prover a sociedade
com regras gerais de conduta e não, nunca, jamais, com comandos diretos ou imposições
abusivas.
As
regras gerais de conduta são um instrumento para que as pessoas possam seguir
os seus próprios caminhos com a mínima frustração possível.
Um
governo conservador não impõe soluções: ele resolve conflitos. Não começa com a
visão de um mundo melhor, um Outro mundo. Começa com este mundo e sabe que é aqui
que vivemos, é aqui que temos de acreditar e, quando a altura chegar, agir
também. Um governo conservador não está preocupado com pessoas concretas, com
classes, com atividades.
Não é
um governo «moralista», no sentido de que exige dos homens determinados
comportamentos tidos por «corretos» - sancionando os «desviantes». A principal preocupação de um governo
conservador é a manutenção da paz e da segurança. Porque é da paz e da
segurança que nasce a liberdade, ou seja, a pretensão legítima dos seres
humanos conduzirem as suas próprias vidas.
Sou
filha de conservadores.
Aprendi desde pequena, no exercício diário da tolerância, que não há
perfeição humana. Não há mundos com prados verdejantes e nem tudo se pode
resolver com slogans de cartilhas. Existe o vício, existe o caos, existem
limites às ideias, existe a falibilidade humana, existe a experiência, existem
dúvidas cruciais que recomendam prudência e não ousadia; e existem ameaças,
perpétuas ameaças, ao que construímos.
O mundo
que pisamos é sempre um mundo frágil, é sempre um mundo que precisa de defesa.
Um conservador acredita nisto: na dúvida, mantém; na dúvida, fica; na dúvida,
conserva. Mas a dúvida não o impede de prosseguir, a dúvida não o impede de
mudar, quando é essa a melhor alternativa, quando o que não temos seja
literalmente melhor do que o que temos.
Mas um
conservador saber que devemos ser nós a assumir essa mudança, que somos nós que
escrevemos o nosso destino, somos nós os responsáveis. Não o partido, não a
multidão que vemos nas ruas, não o Estado que faz sempre menos do que pode.
O que separa, politicamente, um conservador e um
liberal? Sabendo que o conservadorismo acaba na defesa da liberdade e autonomia
individuais e o liberalismo na preservação de uma ordem política imune ao poder
do Estado, haverá diferenças entre liberais e conservadores?
Os conservadores defendem as liberdades (políticas,
econômicas, nomeadamente). Mas temperam ou sobrepõem a essa defesa uma visão
essencialmente cética e pessimista da natureza humana. Nós queremos segurança,
queremos paz, queremos proteger direitos básicos, queremos continuar vivos.
PS: Não caia no conto de candidatos
antidemocráticos que se dizem conservadores ou liberais. Um conservador,
obrigatoriamente, é adepto da Democracia. Ponto.
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