domingo, 24 de agosto de 2014

FEIOS E BONITOS







Qual o papel da boa aparência em política? O que constitui a boa aparência? Sexy é um adjetivo normalmente problemático para mulheres que buscam se eleger?  Há perguntas interessantes a respeito do tema.  Alguns políticos de grande expressão do passado, como Getulio Vargas, que era baixinho e sempre se manteve fora do peso, teriam a mesma popularidade hoje? E Jânio Quadros com aquela aparência de Napoleão de hospício? Os cabelos ajudam? "Cabelos ajudam", diz o ex-governador de Nova York Hugh Carey, que tingia os seus. No Brasil, quase todo o mundo tinge, faz implante ou usa peruca, mas quase ninguém pesquisa, a sério, a questão da aparência. 
 
Nos Estados Unidos, muitos especialistas consultados sobre o tema concordam que aparência suave ajuda em política, mas admitem que podem surgir dúvidas quanto à acuidade intelectual de quem acha que apenas a beleza põe a mesa. Marilyn Quayle disse em 1981, logo depois de seu marido Dan Quayle ser eleito ao Senado (poucos anos depois ele viria a ser vice-presidente dos EUA): "Alguns durante a campanha diziam `não vou votar nele porque ele usa a boa aparência para concorrer'. Bem, o que ele devia fazer? Enfiar um saco no rosto?" A verdade é que muita coisa mudou na política dos EUA desde os debates Kennedy-Nixon em 1960. Com o predomínio da televisão, assessores de campanha passaram a exigir boa aparência ou, pelo menos, a dizer que os candidatos não podem repelir fisicamente os eleitores.

"Depois de 1960, se você for horroroso será muito prejudicado na política", diz Beschloss. "Cem anos atrás, não era bem esse o caso." Até Abraham Lincoln, cujo carisma e presença são inesquecíveis, era geralmente considerado feio - ele próprio o admitia. Morris, o biógrafo de Theodore Roosevelt e Ronald Reagan, disse duvidar que Roosevelt se saísse bem na televisão, por causa de sua "voz muito alta, áspera" e "dentes brancos, rangentes". Mas Reagan, acrescentou Morris, tinha uma "beleza física" que era "uma grande parte de seu poder". 

Traços simétricos, maxilares bem-talhados e ombros largos: John F. Kennedy é geralmente reconhecido como o responsável pelo estabelecimento do padrão perfeito em matéria de atrativos para um presidente. Além da estética quase perfeita, sua grande beleza tornou-se lenda por refletir juventude, energia e entusiasmo.  Gore Vidal conta que, uma vez, numa festa onde estava com Tennessee Williams passou por eles o jovem senador Kennedy. Perderam o fôlego e a visão inspirou ao dramaturgo o seguinte comentário: "Deus do Céu, que belo traseiro!".
 
Nas mulheres, atrativo é coisa mais complicada. Aparência melosa decididamente não ajuda; nenhum dos especialistas conseguiu citar bonecas eleitas, exceto Jeanine Pirro, promotora federal no Condado Westchester (Estado de Nova York). Na opinião de David Garth, “é mais difícil para as mulheres". Mulheres devem parecer atraentes e maduras como Ségolène Royal e Hillary Clinton. Patrick McCarthy dá a Hillary notas bem altas por fixar-se num visual, um conjunto escuro e um penteado. Como consequência, as pessoas pararam de falar de seu cabelo - objetivo de qualquer mulher na política. 
 
McCarthy tem a firme opinião de que a aparência sexy é "desastrosa" para políticos, pois "indica que ele ou ela tem na mente coisas que não se referem à melhor legislação". Atitudes provocantes e sensualidade explícita contrariam em tudo a imagem de eficiência e dever cívico que se espera, ou se deveria esperar, dos políticos. Granger, da revista Esquire, também elogia Hillary por sua aparência bela e austera. "É uma combinação de força e inteligência e também a disposição de juntar firmemente essas armas", diz Granger.
 
Estudos mostram que, quanto mais bonita é uma pessoa, maior é seu salário e maiores são as chances de ser absolvida por um júri. A verdade é que fazemos julgamentos o tempo todo e, hoje, usamos a beleza como um indicador de competência. Pessoas com rosto simétrico ou feições mais definidas seriam vistas como mais dignas de confiança. Além disso, contam pontos também cabelos bem cuidados e roupas alinhadas. Não é por acaso que na época das campanhas, todos eles se cuidam mais. 

A opinião final e unânime dos especialistas é a de que a aparência, em política, nunca importa tanto quanto as posições assumidas ou o firme trabalho nas campanhas. Vale dizer: num mundo em que todos querem ser belos, a política atrai os esteticamente privilegiados e lhes dá um bom empurrão inicial. Depois, seu desempenho tende a ser julgado por padrões mais comuns.


Fontes: historiador Michael Beschloss, especialista em candidatos a Presidência dos EUA, o consultor político David Garth, o ex-governador Mario Cuomo, o ex-prefeito Ed Koch, a ex-candidata à vice-presidência dos EUA Geraldine Ferraro, o consultor-chefe do governador George Pataki para política, o biógrafo de presidentes Edmund Morris, o pesquisador de opinião pública Mark Penn; o chefe de redação da Esquire, David Granger, e Patrick McCarthy, diretor da Crown Books.

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