sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Os meus amigos queridos...

Os amigos são para todas as ocasiões? Não, não são. É absolutamente errado o entendimento da amizade como uma reserva de alimento no depósito (ou como um estojo de primeiros socorros) pronto para ser usado em caso de necessidade. O valor de um amigo não se mede pela quantidade, ou pela prestação de atendimento em caso de eventual necessidade (nossa). O valor de um amigo é precisamente o da eternidade: está lá sempre, mesmo quando não precisamos dele. E um amigo sempre tem o direito de nos abandonar e isso pode acontecer numa situação difícil (para nós). Um bem precioso e único reflete uma obrigatória incerteza. É este o preço. Saber que o amigo foi embora. Escolheu ir embora. E continuar gostando dele mesmo assim.  

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Sempre tive medo de desperdiçar a vida...

Sempre tive medo de desperdiçar a vida. Então fiz tudo furiosamente: estudei, casei, criei a filha, trabalhei, comprei a casa, economizei, busquei algum prestígio profissional, conheci o Brasil, viajei à Europa, aos Estados Unidos, aos países vizinhos, tive algumas doenças, fiz cirurgias, fui a médicos caros no Rio, Brasília e em São Paulo. Envelheci aos poucos, amaldiçoando os tempos dissolutos, escrevendo bem em algumas ocasiões, em outras mais ou menos e em algumas muito mal, mas sempre arruinando minhas sinapses com a maldita sensação de que estava desperdiçando a vida.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Corrupção




MONTESQUIEU
"Aqueles que a princípio tinham sido corrompidos pelas suas riquezas, foram-no a seguir pela sua pobreza. Com bens acima do que convém à condição privada, tornara-se difícil serem bons cidadãos; com os desejos e os desgostos provocados por uma fortuna arruinada, tornaram-se capazes de todos os atentados; e, como diz Salústio, viu-se surgir uma geração de pessoas que nem podiam ter património nem podiam suportar que os outros o tivessem"

( Da Corrupção nos Romanos, trad. de Ruy Belo )
 
 

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Capitu: fruta dentro da casca


"O resto é saber se a Capitu da Praia da Glória já estava dentro da de Matacavalos, ou se esta foi mudada naquela por efeito de algum acaso incidente. Jesus, filho de Sirach, se soubesse dos meus primeiros ciúmes, dir-me-ia, como no seu capítulo IX, versículo 1: « Não tenhas ciúmes de tua mulher para que ela não se meta a enganar-te com a malícia que aprender de ti»: Mas eu creio que não, e tu concordarás comigo; se te lembras bem da Capitu menina, hás-de reconhecer que uma estava dentro da outra, como a fruta dentro da casca".
Machado de Assis, Dom Casmurro

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Desde quando você faz ideia do que é o sofrimento?


"Franz tinha mais ou menos doze anos quando a mãe ficara sozinha com ele, porque um dia, inesperadamente, o pai tinha-se ido embora. Franz suspeitou que estava a passar-se qualquer coisa de grave, mas a mãe disfarçou o drama com uma conversa neutra e ponderada para não traumatizar o filho. Foi nesse dia que, ao saírem de casa para dar uma volta pela cidade, Franz percebeu que a mãe tinha dois sapatos desemparceirados. Ficou aflito e quis preveni-la, mas teve medo de magoá-la. Passou duas horas com ela na rua sem conseguir despregar os olhos dos seus pés. Foi então que começou a fazer uma ideia do que devia ser o sofrimento".
Milan Kundera, A insustentável leveza do ser

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

O homem foi criado para a felicidade


"Na barraca da sua prisão, Pierre ficou ciente, não só com a inteligência mas com todo o seu ser, com a sua vida, de que o homem foi criado para a felicidade, que a felicidade residia no próprio homem, na satisfação das suas necessidades humanas naturais, e que toda a desgraça não provinha da carência mas do excesso; mas agora, nas três últimas semanas de marcha, ficou ciente de mais uma nova verdade consoladora: no mundo nada havia de assustador. Ficou a saber que, do mesmo modo que não existia uma situação em que o homem fosse totalmente feliz e livre, também não existia para o homem uma situação de infelicidade absoluta e de privação total da liberdade. Ficou a saber que havia um limite para o sofrimento e um limite para a liberdade, e que estes limites estavam muito próximos; que o homem que dormia num leito de rosas, ao ver uma pétala enrolada, sofria tanto como Pierre ao adormecer agora na terra fria e húmida, com um lado do corpo gelado e outro quente; ficou a saber que, quando dantes ele calçava os seus sapatos estreitos de baile, sofria tanto como agora que andava descalço (o calçado dele há muito que se desfizera), com os pés cheios de feridas. Ficou a saber que, ao casar-se com a sua mulher de livre vontade (como lhe parecia naquela altura), não era mais livre do que agora em que o fechavam de noite na cavalariça"...
Leon Tolstói, Guerra e Paz

Genesis


De mim não falo mais: não quero nada.
De Deus não falo: não tem outro abrigo.
Não falarei também do mundo antigo,
pois nasce e morre em cada madrugada.

Nem de existir, que é a vida atraiçoada,
para sentir o tempo andar comigo;
nem de viver, que é liberdade errada,
e foge todo o Amor quando o persigo.

Por mais justiça ...-Ai quantos que eram novos
em vão a esperaram porque nunca a viram!
E a eternidade...Ó transfusão dos povos!

Não há verdade: O mundo não a esconde.
Tudo se vê: só se não sabe aonde.
Mortais ou imortais, todos mentiram.

Jorge de Sena

domingo, 17 de janeiro de 2016

Quando Vier a Primavera

Quando vier a Primavera

Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.
A realidade não precisa de mim.
Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma

Se soubesse que amanhã morria
E a Primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
 
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.
 
Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é.
 
Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos

ALÔ ALÔ LEONARDO DiCAPRIO



1) As terras indígenas no Brasil ocupam cerca de 120 milhões de hectares, o equivalente a 13% do território do Brasil. Isso é quase o dobro de toda a área de lavoura (milho, soja, feijão, arroz, etc.). Esta comparação comprova o compromisso do Estado brasileiro com os índios, um compromisso consagrado na Constituição.

2) As demarcações no Brasil não representaram qualquer favor aos índios, mas o cumprimento de um compromisso com a história que está sendo cumprido. É uma hipoteca histórica que temos a obrigação de quitar e que estamos quitando.  Nos últimos 20 anos, o Brasil demarcou uma área maior que a Bélgica.  

3) A maior parte dos territórios que ainda está em discussão não pode ser demarcada imediatamente. São  áreas em litígio judicial, terras que os índios reclamam, mas que, em sua maioria, estão ocupadas por agricultores. É fundamental entender isso: litígio judicial, ou seja, uma decisão que precisa aguardar a deliberação da Justiça.

4) A responsabilidade sobre o destino dessas áreas em litígio não é apenas de uma instância do Poder, mas cabe ao Estado, ou seja, deve resultar de consenso dos representantes do Judiciário que buscam diálogo entre as todas as partes envolvidas - índios, fazendeiros, pequenos agricultores, etc.

5) O Brasil é formado por brasileiros: brancos, negros, índios, descendentes de europeus e  orientais.  


PS: Ao receber o Globo de Ouro como Melhor Ator, Leonardo DiCaprio defendeu os índios e pediu ao mundo proteção para eles. O Brasil é o país com a maior população de índios "aldeados" no mundo, e não estamos parados nesta questão. Claro que devemos fazer mais, mas estamos demarcando terras e temos garantido alguns avanços a eles, tanto que eles voltaram a crescer demograficamente, sinal de que estão readquirindo a esperança no futuro. 

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Amizade


“Aquilo a que chamamos vulgarmente amizade não passa de conhecimentos e relações tecidos por qualquer ocasião ou vantagem em que as nossas almas se cruzam. Na verdadeira amizade, elas fundem-se uma e outra em tão universal confusão que se misturam e já não distinguem a linha que as cerziu. Se me perguntam porque o amava, só posso responder: porque era ele, porque era eu.”
Michel de Montaigne, Ensaios , Livro I, cap. XXVIII (tradução livre).

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Adeus David Bowie!


Morreu David Bowie, um dos ídolos mais desconcertantes do meu tempo.”Freud ia adorar conhecer-me”, dizia. Leia abaixo, algumas declarações de David Bowie:
1. “Há muita gente que parece querer ser imortal… Andamos atrás de quê, exatamente? Quem é que quer arrastar-se, velho e decadente, até ter 90 anos? Só por uma questão de ego? Eu seguramente não quero.”
2. “É verdade — sou bisexual. Foi a melhor coisa que me aconteceu. E é muito divertido, também.”
3. As pessoas poderiam pensar que uma estrela rock casar-se com uma supermodelo seria uma das melhores coisas do mundo. E, de fato, é.” [Sobre o seu casamento com Iman]
4. “O melhor conselho que me podiam ter dado aos 18 anos? Não te metas em drogas.”
5. “Hoje em dia, mais do que nunca, sinto-me um animal social, coisa que a dada altura não era… Às vezes estou tão feliz que deprimo as pessoas.”
6. “À medida que envelhecemos, as perguntas resumem-se a duas ou três. Quanto tempo mais? E o que é que eu vou fazer com o tempo que me resta?”
7. “Sigmund Freud ia adorar conhecer-me.”
8. “Fiz alguns álbuns fabulosos. Tenho que ser honesto. Adoro-os. Adoro as coisas que fiz.”
9. “Falar sobre arte é como dançar sobre arquitetura.”
10. “Sou uma estrela instantânea; basta adicionar água.”
11. “Aquilo que mais adoro na música são as coisas que começam nas franjas.”
12. “Já nem sei quantas vezes é que alguém veio ter comigo e disse: ‘Hey, vamos dançar!’ Eu odeio dançar. Meu Deus, é tão estúpido.” [Sobre o sucesso da música “Let’s Dance”]
13. “Uma vez perguntei ao John Lennon o que é que ele achava do meu trabalho e ele respondeu: ‘É ótimo, mas é apenas rock’n’roll com batom’.”
14. “O rock sempre foi a música do diabo.”
15. “Não sei o que é que vou fazer a seguir, mas prometo que não vai ser chato.”

Fonte: O Observador

sábado, 9 de janeiro de 2016

Só não é natural que seja sanguinário, fanático ou submisso


A jovem ou o jovem tem atenção e interesse pela política? A política é um dos campos mais atraentes da atividade humana porque lida com o poder. Daqui do meu canto fico torcendo pelo ingresso em massa de jovens nos partidos políticos. Jovens de todas as tendências e correntes. Que venham aqueles que se dizem anarquistas, marxistas, leninistas, troskystas, budistas, centristas, direitistas, democratas, liberais, socialistas, capitalistas etc, etc, etc.

Escolhas partidárias de hoje podem mudar amanhã. Como se dizia antigamente quem não é revolucionário aos vinte, dificilmente será democrata aos quarenta. Além disso, só pedras não mudam. Felizmente, as pessoas não são cortadas em mármore. Pessoas mudam. E ainda bem que mudam. Agora, os jovens só precisam definir o ingresso na vida pública, outras decisões podem esperar.

Seria bom que muitos jovens entrassem rápido na vida partidária. De preferência a tempo de participar da corrida eleitoral deste ano. Dos jovens dependem todas as mudanças que o Brasil precisa. A democracia só avançará com eles. E o que um jovem precisa para entrar na política? Ser ele mesmo. A juventude é insubstituível. O jovem renova, reanima e estimula o ambiente onde pisa.

E o que o jovem precisa fazer na política? O que achar certo, o que julgar verdadeiro. Tudo é permitido? Sim. Só não é recomendável repetir erros de ninguém. Que cometam erros novos. E tem alguma coisa que um jovem político não pode ser? Tem. Tem sim. Não é natural que um jovem interessado pela política seja sanguinário, fanático ou submisso. O resto ele pode ser como quiser.   

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

PRECE


Senhor, a noite veio e a alma é vil.
Tanta foi a tormenta e a vontade!
Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade.

Mas a chama, que a vida em nós criou,
Se ainda há vida ainda não é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mão do vento pode erguê-la ainda.

Dá o sopro, a aragem - ou desgraça ou ânsia -
Com que a chama do esforço se remoça,
E outra vez conquistaremos a Distância -
Do mar ou outra, mas que seja nossa!

Fernando Pessoa