quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Minha língua é minha pátria



Todos os brasileiros sabem que o português é a língua oficial do Brasil, e muitos sabem que ele é derivado do latim, mas a maioria desconhece a história do idioma no país e da sua relação com as diversas outras línguas que aqui se falavam antes da chegada de Pedro Álvares Cabral. Segundo o historiador Aryon Rodrigues, do Laboratório de Línguas Indígenas da Universidade de Brasília, quando o Brasil foi descoberto pelos portugueses, havia mais de 1.000 línguas no país, faladas por índios de diversas etnias.

A colonização portuguesa começou gradativamente pelo litoral, a partir de 1532, com a instituição das capitanias hereditárias. Nesse período, diversas comunidades da família Tupi e Guarani habitavam o litoral brasileiro entre a Bahia e o Rio de Janeiro. Havia entre elas uma grande proximidade cultural e linguística. Para estabelecer uma comunicação com os nativos, os portugueses foram aprendendo os dialetos e idiomas indígenas. A partir do tupinambá, falado pelos grupos mais abertos ao contato com os colonizadores, criou-se uma língua geral comum a índios e não-índios. Ela foi estudada e documentada pelos jesuítas para a catequização dos povos indígenas.

Em 1595, o padre José de Anchieta a registrou em sua Arte de gramática da língua mais usada na costa do Brasil. Essa língua geral derivada do tupinambá foi a primeira influência recebida pelo idioma dos portugueses no Brasil. Outro contato que influenciou a língua portuguesa na América foi com as línguas dos negros africanos trazidos como escravos para o país. O tráfico de escravos começou com a introdução do cultivo da cana-de-açúcar na capitania de São Vicente (no estado de São Paulo), no Recôncavo Baiano e em Pernambuco, no começo da colonização. Ele se intensificou no século XVII, espalhando-se por todas as regiões ocupadas pelos portugueses.Os escravos acabaram aprendendo o português, para se comunicar com os seus senhores.

O lingüista Mattoso Camara Jr., em História e Estrutura da Língua Portuguesa, afirma que, no Brasil, os escravos chegaram a desenvolver um português crioulo, tal como ocorreu nas colônias africanas. Camara Jr. diz ainda que os africanos também se adaptaram à língua geral de origem indígena, que continuava a ser a mais falada entre os colonos. Um texto do padre Antonio Vieira, de 1694, diz que a língua que as famílias portuguesas falavam em São Paulo era a dos índios. A predominância do português começou com os bandeirantes e a descoberta das minas de ouro e diamante. Com isso, chegaram mais imigrantes portugueses para ocupar os novos centros econômicos.

Em 17 de agosto de 1758, a língua portuguesa se torna idioma oficial do Brasil, através de um decreto do Marquês de Pombal, que também proíbe o uso da língua geral. No ano seguinte, os jesuítas, que haviam catequizado os índios e produzido literatura em língua indígena, foram expulsos do país por Pombal. A essa altura, o português já havia tido a evolução natural que sofre toda língua no decorrer do tempo. As mudanças, porém, se deram de maneira distinta em Portugal e no Brasil. Paul Teyssier, em Histoire de la langue portugugaise, conta que no final do século XVIII, o brasileiro já aparece no teatro português como um personagem com peculiaridades em sua fala.

Um exemplo que ele apresenta é generalização do uso da forma de tratamento que até hoje se mantém no Brasil, mas que em Portugal era empregada apenas familiarmente: o "você", redução de "voismicê", que por sua vez deriva de "vossa mercê". Além disso, quando Pombal decretou a obrigatoriedade do uso do português no Brasil, os falantes brasileiros já haviam incorporado diversas palavras de origem indígena e africana em seu vocabulário. Muitos nomes de plantas, frutas e animais brasileiros têm origem no tupinambá. Alguns exemplos são abacaxi, araticum, buriti, caatinga, caju, capim, capivara, carnaúba, cipó, cupim, curió, ipê, imbuia, jaboticaba, jacarandá, mandacaru, mandioca, maracujá, piranha, quati, sucuri e tatu.

A toponímia, ciência que estuda a origem dos nomes de lugares, também revela um grande número de palavras indígenas na fala do brasileiro: Aracaju, Avaí, Caraguatatuba, Guanabara, Guaporé, Jabaquara, Jacarépaguá, Jundiaí, Parati, Piracicaba, Tijuca, etc. A influência indígena também acabou propiciando a criação de expressões idiomáticas, como "andar na pindaíba" e "estar de tocaia", que são marcas linguísticas de uma cultura específica. Os africanos do grupo banto e ioruba deixaram um legado próprio na cultura do nosso país. A culinária afro-brasileira tem o abará, o acarajé e o vatapá; e o candomblé tem orixá, exú, oxossi, iansã. O quimbundo, língua falada em Angola, emprestou ao português do Brasil palavras do vocabulário familiar, como caçula, cafuné, molambo e moleque. Termos que expressavam o modo de vida e as danças dos escravos, como senzala, maxixe e samba, também se incorporaram ao nosso léxico.

Certas comunidades africanas no Brasil, além de falarem o português, preservaram a sua língua de origem, que se mantém viva no país até os dias de hoje. É o caso dos habitantes do Cafundó, bairro rural do município de Salto de Pirapora, no estado de São Paulo. Alguns estudiosos afirmam que as influências não se restringiram apenas ao vocabulário. Jacques Raimundo, em O Elemento Afro-Negro na Língua Portuguesa, aponta algumas mudanças fonéticas, iniciadas na fala dos escravos, que se mantêm no português do Brasil: as vogais médias pretônicas "e" e "o" passam a ser pronunciadas como vogais altas, respectivamente "i" e "u" (mininu, nutiça); as vogais tônicas de palavras oxítonas terminadas em "s", mesmo as grafadas com "z", se tornam ditongos (atrais, mêis, vêis); a marca de terceira pessoa do plural, nos verbos do pretérito perfeito, se reduz a "o": fizero, caíro, tocaro.

Em 1822, Jerónimo Soares Barbosa registrava em sua Grammatica Philosophica, uma peculiaridade sintática, originada na fala dos escravos, que até hoje é apontada como uma das distinções entre o português falado em Portugal e o que se fala no Brasil: a colocação de pronomes átonos antes dos verbos (mi deu, ti falô). Após a independência do Brasil, o tráfico de escravos diminui, até cessar por volta de 1850. Muitos índios se miscigenaram e novos imigrantes europeus, como alemães e italianos, chegaram ao país. O novo contato do português brasileiro com outras línguas foi um dos fatores que gerou as diversas variedades regionais existentes hoje no Brasil.

Na segunda metade do século XIX, os autores do Romantismo tentam retratar em sua obra uma brasilidade que distingua a ex-colônia de Portugal. Além de exaltar a figura do índio, autores como José de Alencar trazem para a literatura a linguagem própria do brasileiro.O movimento modernista, no começo do século XX, retoma a idéia romântica de resgate das origens e construção de uma identidade própria, com projetos como a Gramatiquinha da Fala Brasileira, pensada por Mário de Andrade. A discussão sobre as distinções entre a fala de Portugal e a do Brasil se mantêm até hoje.

O brasileiro incorporou empréstimos de termos não só das línguas indígenas e africanas, mas do francês, do espanhol, do italiano, do inglês, mas a maior parte do nosso vocabulário é idêntica a do português europeu. As diferenças fonéticas é que são notáveis. E algumas distinções semânticas também se verificam. Segundo o lingüista brasileiro Mário Perini, professor convidado da Universidade do Mississipi, nos EUA, as mudanças na língua são naturais e fatalmente acontecem quando duas comunidades linguísticas se separam geograficamente.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Educação fundamental



Ainda sobre educação, gostaria de dizer que a Escola Fundamental deveria ser prioritária. Mais: enquanto não for assim vão se perpetuar as causas do nosso atraso. Sim, o ensino fundamental é a base de tudo. Alguns educadores, inclusive, chamam a atenção para o fato de que a obrigatoriedade do ensino primário no Brasil fez-se com grande atraso.

Enquanto as nações hoje desenvolvidas contaram com o precedente da chamada “educação popular”, fomentada inicialmente pelas igrejas protestantes e, ao longo do século XIX, discutiram as formas de torná-la pública e obrigatória, chegando aos fins da centúria com níveis expressivos de escolaridade, no Brasil somente se cogitou da providência na Constituição de 1934.

Quando se decidiu, na Constituição de 1967, estender a obrigatoriedade a 8 anos, não se tinha cumprido a disposição constitucional anterior. Adicionalmente, o Estado nunca se preocupou em mobilizar as famílias e as igrejas para suprir essa lacuna. Em síntese: ensino fundamental, de fato, nunca se constituiu em autêntica prioridade no Brasil. Pena...

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Só a educação garante avanços


O Ministério da Educação divulgou nesta segunda-feira o novo valor do piso salarial nacional para os professores de educação básica: R$ 1.451. Isso seria o mínimo a ser pago para professores com jornada semanal de 40 horas. Acontece que esse número é de araque: mesmo sendo federal, a lei do piso não vale em 17 estados. Também não é cumprida na maioria dos municípios. Isso quer dizer que os resultados desastrosos do Brasil na educação podem ser explicados com clareza: não existe ensino sem educador. E não existe educador sem salário. Como não existem médicos ou policiais. Simples assim.

Escrevi educadores, mas devia ter escrito educadoras. O Brasil é o país das professoras. Com exceção da Itália, em nenhum outro país do mundo há tantas mulheres exercendo o magistério quanto aqui. Pesquisa da Unesco mostrou que, da 1ª à 6ª série do ensino fundamental, a porcentagem de mulheres dando aulas no Brasil é de 94%. Em um total de 138 países comparados, a porcentagem só não é maior do que a da Itália, onde as mulheres representam 94,6% dos professores nesse nível de ensino.

O perfil majoritariamente feminino dos professores nas séries iniciais não é exclusividade do Brasil. É assim em quase todos os países do mundo, até mesmo nos mais desenvolvidos. A proporção de mulheres dando aulas na média de todos os países é de 77%. Tudo indica que o trabalho docente é mais atraente para as mulheres, porque elas têm outros papéis em casa. Além disso, especialistas assinalam: por serem mais verbais e mais fluentes, as professoras tendem a favorecer mais a aprendizagem da língua e a expressão oral. E onde estaria a desvantagem?

A grande desvantagem da feminização do magistério é que, no mundo inteiro, a mulher ganha, em média, menos do que o homem, o que tende a baixar o salário do professor. No Brasil, como lá fora, o que se repete é um padrão atrasado: mulheres ganham menos pelo mesmo trabalho. Sim, apesar de terem cumprido uma jornada espetecular nos últimos anos, as mulheres são obrigadas a seguir lutando. Há muito trabalho a fazer. Profissões onde predomina a presença feminina são pior remuneradas e, em geral, têm menor prestígio social.

A desigualdade é cruel em todos ofícios. No caso do magistério, estou certa que prejudica as crianças e o país. Compromete o futuro, ou melhor, limita o futuro. Só a educação garante avanços. Então, é o caso de perguntar: quando essa questão salarial da educação será resolvida? O baixo salário na área da educação é questão antiga. Os primeiros professores foram membros da ordem dos jesuítas e documentos da época já falavam em baixos salários e péssimas condições de trabalho. No século 19 os homens se afastaram da educação fundamental e as mulheres assumiram os encargos da educação.

Além de bem aceita socialmente, era uma alternativa para contribuir com a renda familiar porque o marido, sobretudo o funcionário público ou militar, não tinha bons salários. Bem, esse papo de complementar renda não faz mais sentido...Afinal, mais de um terço das mulheres brasileiras são chefes de suas famílias, sustentam suas casas e criam os filhos sozinhas. Se forem professoras, terão enormes dificuldades para honrar seus compromissos. Não é justo. Por razão simples: nenhum trabalhador qualificado pode viver com tão pouco.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

O que é o jornalismo?



O que é o jornalismo? Uma atividade que busca a produção do conhecimento. E o principal conhecimento é sobre os fatos diários.Nesse sentido, o jornalismo deve manter proximidade e afinidade com as ciências sociais, em especial a História. Assim: o jornalismo produz um primeiro conhecimento que será aperfeiçoado e devidamente analisado mais tarde pelos historiadores.

Quanto aos órgãos de imprensa, gosto da seguinte distinção: pratica jornalismo todo veículo cujo propósito central seja conhecer, produzir conhecimento, informar. O veículo cujo objetivo central seja convencer, atrair adeptos, defender uma causa faz propaganda. Algo bem diverso de um jornal generalista de informação: este pode noticiar os fatos e analisá-los com a correção necessária.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Antes, tatuagem não era feita com anestésico e rebeldia doía...



Li em algum lugar que tatuagem virou expressão cultural porque todo o mundo escolhe alguma marca pessoal e imprime no corpo. Piercing também parece até sandália havaiana, todo mundo tem e quem não tem só vai esperar até o fim do verão para dependurar um alargador na orelha, ou algum metal no nariz, no umbigo ou mesmo na testa.

Confesso que esse formato moderno me espanta. No tempo que eu era jovem, tatuagem e piercing eram símbolos de rebeldia e rebeldia era coisa séria. Não era essa esculhambação. Ninguém podia imaginar que seria possível fazer tatuagem com anestésico, por exemplo. E piercing muito menos. Antes, rebeldia doía.

E comprar a calça jeans rasgada e pré-lavada então? Não passava pela cabeça de ninguém. A gente ficava horas no tanque tentando desbotar o brim. Lembro que gastei um tempão mas só consegui arruinar a calça. Agora, quando vejo um jeans “velhíssimo”, mas com cheiro de novo, o que me ocorre, sem ressentimentos, é que tudo ficou fácil para as novas gerações. Até acreditar nessa rebeldia de araque...

Não é do meu feitio falar mal das novas gerações. Ao contrário: considero a juventude insubstituível. Só não posso deixar de observar que, na história da humanidade, nunca existiram jovens tão arrumados e tão produzidos como os de hoje. Nem descabelar eles descabelam...

Até os coques no cabelo são arrumados para que pareçam levemente desarrumados. As roupas top de linha, e que costumam custar um orçamento do Pentágono, são cuidadosamente misturadas a uma peça mais pobrinha, garimpada em algum brechó, para que tudo pareça despojado e natural.

É muita encenação para quem passou dos 50. Para mim, esses "rebeldes" que andam pelas ruas com suas tatuagens e piercings anestesiados, os cabelos escovados e os corpinhos depilados são imaturos demais e ainda não podem ser chamados de jovens. Na verdade, não passam de querubins amamentados.