Como dizia Mitterrand, a política, para além de representar a tentativa permanente da solução dos problemas de pessoas concretas que vivem em sociedade, também é um ato humano carregado de significado. Exige caráter, coragem, dedicação e amor ao próximo. Exige gente capaz de grandes gestos e de rupturas indispensáveis. Gente que não aceita o anonimato, a linearidade e a insignificância.
quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018
sábado, 17 de fevereiro de 2018
A morte absoluta
Morrer.
Morrer de corpo e alma.
Completamente.
Morrer tão completamente
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: “Quem foi?...”
Morrer de corpo e alma.
Completamente.
Morrer sem deixar o triste despojo da carne,
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão — felizes! — num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão — felizes! — num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.
Morrer sem deixar porventura uma alma errante…
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?
Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,
A lembrança duma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento.
Em nenhuma epiderme.
A lembrança duma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento.
Em nenhuma epiderme.
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: “Quem foi?...”
Morrer mais completamente ainda,
— Sem deixar sequer esse nome.
— Sem deixar sequer esse nome.
Manuel Bandeira, Lira dos Cinquent’anos (1940)
domingo, 11 de fevereiro de 2018
A verdade...
Advertência: A linguagem pode ser a forma principal das pessoas se esconderem. Sobre isso Fernando Pessoa disse: "quando falo com sinceridade, não sei com que sinceridade falo".
sábado, 10 de fevereiro de 2018
Carnaval e Futebol
Numa sociedade em que as emoções são cada vez
mais controladas em nome da civilização e dos deveres de convivência, Carnaval
e Copa são fantásticos momentos de excitação, transgressão e de certo
descontrole de algumas manifestações reprimidas.
São instantes com todos os ingredientes de que
se compõe o melhor da vida: a competição, a sorte e o azar, o talento, a
superação, o riso, o choro, o risco e o suposto elemento neutro: o árbitro —
que nos permite justificar qualquer revés.
Aquele senhor de preto correndo pelo campo e os
juízes invisíveis das notas na quarta-feira nos permitem considerar que nem
toda a derrota é total. Nada mais humano que justificar os 7 x1 que temos de
enfrentar nas derrapagens da vida.
A explosão de alegria do Carnaval — com o
inacreditável pit stop das mazelas rotineiras — causa espanto e admiração. Já a paixão pelo futebol, normal aqui e em
todos os países do mundo, é um fenômeno que devia ser melhor apurado por estudiosos.
No Brasil, o futebol é tudo e o resto é quase
nada. Não é por acaso que a elite dirigente tenta usar o esporte como
instrumento legitimador. Tem muita coisa em jogo aí. É por meio desse esporte que indivíduos
excluídos chegam à condição de heróis.
É por meio das competições entre clubes e países
que os pobres conseguem ter a sensação de “pertencer” a uma torcida, a um time
e, principalmente, ao Brasil. É um dos
únicos momentos em que os pobres “pertencem”, fazem parte de algo.
Os jogadores são elevados à condição de heróis
por várias razões. Uma delas: são a afirmação de um sentimento raro: o orgulho
de ser brasileiro. Outra: dão a entender que existe mobilidade e que
somos um país de avanços sociais, o que nem é verdade.
Para alguns críticos, o futebol induz ao
conformismo. E daí, pergunto eu. Em um país marcado pela desigualdade só o
futebol ainda pode nos fazer acreditar, pelo menos em raros momentos, que somos
todos iguais, todos brasileiros e que estamos todos juntos.
O futebol cumpre funções muito além do que seria
racional porque o Estado é incapaz de promover políticas públicas de educação.
Sem escola, o brasileiro destaca-se pelo futebol (Pelé etc) pela música (Tom
Jobim etc) e pela beleza (Gisele etc).
Como dizia Darcy Ribeiro, os dons do brasileiro
não chegam pela escola, mas pela natureza, pela genética ou pelas mãos de Deus.
Em 2018 temos uma Copa e, mais uma vez, devemos nos consagrar na Rússia pelo
nosso maior esporte.
A autoestima do país dependerá do resultado da
competição. É sofrido saber disso – afinal o jogo é dominado pela
arbitrariedade: a sorte e o azar, ou o mau momento de um jogador. Não há nada a
fazer. Paciência...vamos todos compartilhar uma festa fantástica.
É Carnaval, não leve a mal, mas não posso
encerrar sem dizer uma coisa: levando em conta a descrença geral, só fico
preocupada com uma coisa: o que é que vai acontecer num eventual cenário de
derrota? Bate na madeira, mangalô três vezes.
sábado, 3 de fevereiro de 2018
A qualidade da democracia
Tão
importante como a democracia em si mesma é a sua qualidade. A democracia qualifica-se,
entre outros fatores, pela transparência no exercício da função política e
pelas medidas adotadas para prevenir os conflitos de interesses e a corrupção,
o que influencia enormemente a credibilidade e a confiança que as instituições
inspiram nos cidadãos.
A
fiscalização da atividade de representação e a transparência na defesa de
interesses (lobbying) nos três poderes significa instrumento fundamental de
integridade e lisura no exercício das atividades públicas.
Na
Europa há quem defenda, em nome da separação dos poderes, a incompatibilidade de advogados na função
parlamentar. Alegam que advogados participam na função judicial de aplicação
das leis e podem ter interesses em alterar ou manter determinada legislação em
função das causas dos seus clientes em lugar das causas da cidadania.
Argumentam
que os fundadores da teoria da separação de poderes (Locke e Montesquieu, principalmente)
consideram essencial um ponto: quem faz as leis não deve participar na sua
execução, e vice-versa. Nessa perspectiva, advogados-deputados e juízes com participação em escritórios de advocacia estariam infringindo
as regras.
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