(David Brooks - O Estado de S.
Paulo, 08) Na faculdade eu me considerava um socialista. A melhor versão do
socialismo foi definida por Michael Walter: “O que afeta a todos tem de ser
resolvido por todos”. Por que temos de conviver com pobreza e desigualdade? Por
que as pessoas não estão acima dos lucros?
O socialismo é a mais
persuasiva religião secular de todos os tempos, lhe dá um ideal igualitário
pelo qual você se sacrifica e dedica sua vida.
Contudo, minhas simpatias
socialistas não sobreviveram muito tempo depois que me tornei jornalista.
Rapidamente notei que as autoridades de governo que eu estava cobrindo não eram
capazes de planejar a sociedade que pretendiam criar. Não porque eram ruins ou
estúpidas. O mundo é simplesmente muito complicado.
E então compreendi que o
capitalismo é realmente bom na obtenção de algo que o socialismo é realmente
ruim: criar um processo de aprendizado que auxilia as pessoas a encontrarem a
resposta para alguma coisa.
Se você quer montar uma
empresa de aluguel de carros, o capitalismo tem um conjunto de sinalizações de
preço e mercado e uma capacidade de resposta que vai lhe dizer que tipo de
carros as pessoas querem alugar, onde colocar sua empresa, quantos veículos
deve encomendar. E tem um processo competitivo impulsionado pelo lucro para
incentivá-lo a aprender e inovar.
As economias socialistas
planificadas – que é a propriedade comum dos meios de produção – interferem nos
preços e outros instrumentos de sinalização do mercado. E suprimem ou eliminam
o lucro que é o que estimula as pessoas a desejarem aprender e melhorar.
O padrão de vida das pessoas
sempre foi achatado em toda a história até chegar o capitalismo. Desde então o
número de bens e serviços disponíveis para a média das pessoas aumentou
10.000%.
Se você tem alguma vivência,
já observou que o capitalismo produziu a maior redução da pobreza na história
humana. Em 1981, 42% do mundo vivia na pobreza extrema. Hoje a porcentagem está
em torno de 10%.
E viu que nações que
instituíram reformas de mercado, como Coreia do Sul e a China de Deng Xiaoping,
ficaram mais ricas e orgulhosas. Aquelas que se voltaram para o socialismo,
como a Grã-Bretanha na década de 1970 e a Venezuela mais recentemente, tendem a
ter mais pobres e miseráveis.
E se deu conta de que o meio
ambiente é muito melhor em países capitalistas do que nas economias
planificadas.
O Produto Interno Bruto (PIB)
americano mais do que dobrou desde 1970 e o consumo de energia aumentou. As
emissões de carbono per capita dos EUA registraram sua maior queda em 67 anos,
em 2017.
As maiores degradações
ambientais se verificam nos sistemas planificados, como a antiga União
Soviética e a China comunista.
O Fraser Institute, um grupo
de estudos direcionado para o livre mercado, realiza um ranking de países
segundo dados como menos regulamentação, livre comércio, garantia de direitos
de propriedade.
As economias mais livres do
mundo são de países como Hong Kong, EUA, Canadá, Irlanda, Letônia, Dinamarca.
Ilhas Mauricio, Malta e Finlândia. Nações que estão nos quatro primeiros
lugares em termos de liberdade econômica têm em média um PIB per capital de US$
36.770. No caso dos que ocupam os quatro últimos lugares o PIB per capita é de
US$ 6.140. As pessoas nas economias livres têm expectativa de vida de 79,4
anos. Nas economias planificadas, de 65,2 anos.
Durante o século passado, as economias estatizadas produziram muita pobreza e
escassez. E é ainda pior quando as elites políticas sabem o que você pode fazer
com essa escassez. Elas a transformam em corrupção. Quando as coisas são
escassas você precisa subornar agentes do governo para consegui-las. Em breve
todos estão subornando. Os cidadãos percebem que o sistema inteiro é uma
fraude. Um sistema que começa com um grande idealismo acaba em corrupção,
desonestidade, opressão e desconfiança.
Compreendi os males do
socialismo rapidamente e lentamente me tornei republicano. Meu primeiro herói
econômico foi Alexander Hamilton. Ele veio para os EUA com praticamente nada e
encontrou uma economia dominada por oligarcas donos de terras como Thomas
Jefferson. E entendeu que a solução era tornar todos capitalistas. Criou
mercados de crédito de modo que o capital fluísse e mais pessoas tivessem
acesso a investimentos.
Meu outro herói é Abraham
Lincoln. Proferiu mais discursos sobre bancos e projetos de infraestrutura do
que sobre escravidão porque desejava propagar o capital e azeitar as rodas do
comércio para que rapazes e moças como ele pudessem ascender na vida.
Outra grande figura americana
é Theodore Roosevelt. Ele amava o dinamismo que o capitalismo desperta e sabia
que às vezes é preciso limitar as corporações gigantes de modo que capitalistas
menos estabelecidos consigam competir.
Todos esses líderes
compreenderam que a resposta para os problemas do capitalismo é um capitalismo
mais amplo e mais equitativo.
Mas o capitalismo, como todos
os sistemas, sempre fica desequilibrado. Na última geração, ele produziu a
maior redução da desigualdade de renda global na história. O inconveniente é
que trabalhadores sem especialização nos EUA hoje competem com aqueles no
Vietnã, na Índia e na Malásia. A redução da desigualdade entre as nações levou
ao aumento da desigualdade nas nações ricas.
Além disto, os níveis
educacionais não acompanharam a tecnologia. Esses problemas não são indicativos
de que o capitalismo faliu. São sinais de que precisamos de um capitalismo
melhor.
Necessitamos de uma injeção maciça de dinheiro e reformas nos nossos sistemas de ensino. Precisamos de programas sociais que não só subsidiem o consumo das pessoas pobres, mas sua capacidade de produzir.
Precisamos de cooperativas de
trabalhadores que criem capacidades e representem o trabalhador na mesa de
negociação.
Precisamos de subsídios
salariais e subsídios para a mobilidade para que as pessoas possam transitar
para onde houver oportunidades.
Precisamos subsidiar os
impostos para a saúde de modo a tornar mais fácil para um empregado mudar de
emprego. E precisamos estabelecer créditos fiscais mais altos sobre a renda
auferida para dar ao trabalhador pobre a segurança financeira.
Um grande erro dos conservadores foi achar que tudo o que torna o governo mais
intervencionista também torna os mercados menos dinâmicos. Não conseguimos
distinguir entre o Estado que oferece suporte e o Estado regulador.
Não sei se o modelo escandinavo funcionaria em países grandes e diversificados.
Mas seu sucesso aponta para algumas verdades: o Estado cria prosperidade quando
seus cidadãos se tornam capitalistas e gera níveis incríveis de miséria quando
interfere demais.
Hoje o debate real não é entre
capitalismo e socialismo. Durante cem anos fizemos esses experimentos sociais e
o capitalismo venceu. A discussão é entre uma versão de capitalismo
democrático, como em EUA, Canadá e Dinamarca, e formas de capitalismo
autoritário, como na China e na Rússia. Nossa tarefa é lograr a versão mais
ampla e justa de capitalismo.
A discussão é entre uma versão de capitalismo democrático e formas de capitalismo
autoritário.