Comprei um presépio para Giovana, minha neta de sete anos. Sempre
defendi a formação religiosa das crianças. Como
escreveu Dostoievski, no seu último e monumental romance Os
Irmãos Karamazov, “se Deus não existe tudo é permitido".
Mantive minha fé no correr da vida, apesar de muitas divergências com a
Igreja, mas hoje, na maturidade, nunca me senti tão distante das ideias
religiosas como neste momento.
Quando li Nietzsche na juventude fiquei muito perturbada com suas
pesadas críticas, a bem da verdade, com sua forma impiedosa e verdadeira de
enxergar o catolicismo.
Para fugir ao conflito pessoal (sou especialista nisso) lembro-me de ter
pensado que, na prática, as coisas não eram assim tão lamentáveis, uma vez que
os católicos se beneficiavam de suas crenças. E, por meio delas, realimentavam
a esperança.
A minha fé é assunto privado que não depende das leituras ou das minhas
flutuações opinativas. Leio a Bíblia com proveito, tenho santo de devoção
(São José) e procuro cumprir as obrigações espirituais desde o tempo do catecismo.
Nunca fui surda ao poder cultural da religião. Na verdade, eu creio que Deus é a maior das ideias humanas.
Nunca fui surda ao poder cultural da religião. Na verdade, eu creio que Deus é a maior das ideias humanas.
Nos últimos anos, contudo, minhas relações com uma Igreja que concede
perdão sem limite e, com isso, favorece a impunidade, passaram a incomodar-me
profundamente.
Sinto falta da força e da nobreza da religião de S. Paulo e de Sto.
Agostinho. Ao agarrar-se à pieguice, o catolicismo parece ignorar que tem atrás
de si uma longa tradição intelectual. Tradição que esses dois santos
representam com louvor.
Hoje, no entanto, tudo no catolicismo mudou depois dos escabrosos e
imperdoáveis casos de pedofilia. E a Igreja Católica definitivamente
não parece ter força para se levantar, depois da gestão catastrófica dos
crimes em série feita por Roma.
Não é por acaso que nunca me
senti tão distante da opinião católica, como neste momento. Mesmo assim,
comprei um presépio para minha neta. Como podem ver, este é o texto de uma
católica que não tem orgulho da sua Igreja, mas que não vê mal em ensinar uma
criança a ter fé, a acreditar.